De maneira a conhecermos melhor o curso e a profissão de Enfermagem Veterinária, estivemos à conversa com a Enfermeira Veterinária Lígia Lima, que patilhou connosco um pouco sobre o seu curso e a sua profissão.
Ariana Galamba (A.G): Fala-nos um pouco do teu curso, em que consiste e quais são as saídas profissionais?
Lígia Lima (L.L): O curso universitário que eu escolhi foi a licenciatura em Enfermagem Veterinária. É um curso ainda recente e em constante atualização e tem como vantagem abordar diversas áreas de formação. É um curso lecionado em escolas superiores agrárias que podes encontrar ao longo de todo o território de Portugal Continental e como qualquer curso apresenta aulas teóricas e também aulas de campo e laboratoriais. As saídas profissionais vão desde as mais óbvias (como clínicas e hospitais veterinários) até às menos conhecidas (empresas do ramo agroalimentar, associações de proteção e defesa dos animais, matadouros, biotérios, entre outros).
A.G.: Foi a tua primeira escolha? Quais foram os factores que consideraste para frequentar este curso?
L.L.: Não foi a minha primeira escolha. Sou apaixonada por diversas áreas e escolher uma à qual me dedicar mais não foi uma tarefa fácil. Contudo, assim que tomei essa decisão nunca pensei voltar atrás. É um curso fascinante e versátil onde se aprende muito sobre muitas coisas.
A.G.: Que aspectos positivos e negativos gostarias de referir sobre o teu curso e a tua instituição?
L.L.: A instituição na qual me formei foi a Escola Superior Agrária de Ponte de Lima pertencente ao Politécnico de Viana do Castelo. Como aspetos positivos, sem dúvida os professores incansáveis e experientes que tive, que sempre se preocuparam em organizar visitas de estudo e a mostrar desde cedo a realidade do mercado de trabalho. O facto deste curso ser bastante rico e diverso e ter frequentemente materiais de apoio ao estudo fornecidos pelos professores, através de uma plataforma digital denominada Moodle, são sem dúvida outro fator positivo. As aulas com conteúdos de aprendizagem distintos desde os típicos PowerPoints aos seminários e visitas de profissionais de sucesso nas mais diversas áreas da veterinária permitem aos alunos conhecer diferentes realidades e ganhar motivação para todos os sonhos que queiram realizar. O ambiente calmo e amigável, os diversos animais, a semana das ciências da vida e da terra com diversas palestras relevantes. Poderia continuar por horas (risos).
Como aspetos negativos, diria as infraestruturas escolares antigas e a escassez de material a ser utilizado durante as aulas práticas, bem como o facto destas se centrarem muito na parte clínica e hospitalar.
A.G.: Como descreverias a tua experiência neste curso?
L.L.: Diria sem dúvida que foi uma experiência enriquecedora tanto a nível profissional como pessoal que me permitiu aprender muito, crescer e superar muitos medos e desconfortos.
A.G.: Como foi a tua adaptação ao Ensino Superior? Que desafios tens enfrentado/enfrentaste?
L.L.: Esta questão é bastante interessante e pertinente para mim. Foi um enorme desafio e convido a todos os que estão a ler esta entrevista a explorarem os meus textos da Uniarea porque sem dúvida que eles refletem tudo aquilo por que passei.
A.G.: Na tua opinião, o curso prepara-te bem para o exercício de uma profissão? Como é a componente prática do curso?
L.L.: Atualmente o curso já sofreu um upgrade bem grande no seu plano de estudos e não duvido que apostar neste curso agora é uma mais-valia ainda maior. Contudo, no que toca à minha experiência, diria que nenhum curso prepara para o exercício de uma profissão. Isto porque é a enfrentar a realidade do mundo profissional, a responsabilidade e a exigência que qualquer aluno formado se prepara. E acreditem, inicialmente pode ser um desafio muito difícil, onde a persistência será a vossa maior aliada. A licenciatura em Enfermagem Veterinária tem muitas aulas práticas sobretudo na área de clínica de animais de companhia e produção, parasitologia animal e segurança alimentar.
A meu ver, a componente de estágios encontra-se muito bem delineada, apesar de achar que a mesma deveria ter uma duração mais prolongada. No meu caso, as minhas experiências foram bastante positivas, consegui escolher três áreas distintas da Enfermagem Veterinária e fiz clínica de animais de companhia, realizei cuidados de higiene veterinários a cavalos e ainda tive a oportunidade de analisar animais a nível post mortem, que foi a experiência que mais gostei até hoje.
A.G.: Consideras o teu curso difícil? Porquê?
L.L.: Não diria que se trata de um curso difícil, mas sim de um curso que exige bastante estudo e dedicação.
A.G.: Enquanto licenciada, quais eram as tuas expectativas enquanto estavas ainda a frequentar o curso? Sentiste que essas expectativas corresponderam à realidade?
L.L.: Esta pergunta é bastante engraçada porque aquando do início do curso e da chegada dos estágios finais de licenciatura, os meus sonhos/expectativas passavam todos pela área de cuidados intensivos em animais de companhia. Contudo, foi com a experiência e a entrada no mercado de trabalho que eu mudei completamente essas minhas idealizações.
Assim que me iniciei nas áreas da anatomohistopatologia animal e experimentação animal soube que tinha encontrado a minha vocação.
A.G.: Consideras necessário prosseguir estudos nesta área (pós-graduação, mestrado, doutoramento)?
L.L.: Eu diria que para qualquer área é necessário prosseguir estudos porque é o que te permite não estagnar e acompanhar de perto as evoluções, que nesta área são constantes. Claro que a licenciatura permite que exerças as tuas funções como Enfermeiro Veterinário, mas para os mais ambiciosos eu diria que prosseguir estudos é sempre a chave para se chegar mais longe.
A.G.: Voltarias a fazer esta escolha de curso?
L.L.: Sem dúvida! Como já referi é um curso muito versátil, o que para os mais indecisos, como eu,, ajuda bastante.
A.G.: Como é o dia-a-dia de um Enfermeiro Veterinário?
L.L.: Ora bem, a resposta a esta pergunta varia muito consoante a área de actuação. No meu caso, posso dizer que o meu dia a dia é passado num animal facility onde a correria e o stress são uma constante. É formado por um conjunto de várias salas, onde nelas tens diferentes espécies de roedores num número considerável (pode ser 100 como mais de 2000), depende sempre da espécie e da sala em que te encontras. Essencialmente eu começo por limpar todas as gaiolas dos animais, colocar-lhes água e comida e de seguida analiso-os individual e cuidadosamente. Existem planos de tratamento para cada patologia associada que são definidos pela Médica Veterinária responsável. Faço limpeza das instalações ao final do dia e ainda esterilizadas, sempre que as mesmas são estritamente necessárias.
A.G.: Qual é a situação a nível de empregabilidade com que te tens deparado?
L.L.: Infelizmente, não é a melhor. O curso de Enfermagem Veterinária é ainda muito recente e infelizmente em Portugal é cada vez mais ignorado e substituído pelos auxiliares, o que a meu ver é um enorme erro. Um auxiliar é necessário para a recepção e limpezas, a sua formação não contempla muito mais do que isso. Um Enfermeiro tem competências para auxiliar em cirurgias, para trabalhar a nível das indústrias farmacêuticas, para actuar nos cuidados pré e pós-operatórios, para actuar nas áreas do comportamento animal, nos laboratórios, entre outros. A meu ver, com a extensão tão grande de competências que um Enfermeiro tem e que antes muitas dessas actividades apenas eram realizadas pelos médicos, é como se os mesmos nos vissem como uma ameaça e não como aliados que somos.
Mas claro que em tudo isto há excepções e temos muitos Médicos Veterinários em Portugal que nos apoiam e motivam para progredirmos na carreira. Para tudo é preciso uma enorme vontade de lutar e também um espírito de sacrifício muito afinado, porque para os Enfermeiros é difícil, mas os Médicos também não têm carreiras perfeitas, lembrem-se disso.
A.G.: O que sentes em relação aos teus resultados?
L.L.: Atualmente, com a licenciatura concluída há 2 anos, um artigo publicado como primeira autora numa revista técnica, experiências profissionais enriquecedoras na área da Medicina Legal Animal e Experimentação Animal, sinto que sou uma profissional bem-sucedida, que se destaca pelo brio profissional- diria que os resultados estão à vista. Mas não se iludam, tudo isto vem com muito esforço e dedicação.
A.G.: O que é que gostarias de dizer aos futuros candidatos/interessados nesta área?
L.L.: Diria para aproveitarem ao máximo o que este curso oferece.
A.G: Muito obrigada, Lígia, pela tua colaboração. Esperamos cruzar-nos com mais enfermeiros veterinários no futuro.