A educação sobrevive apenas com um único encarregado?

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A toda a altura estamos a aprender e, consequentemente, a educar. A aprendizagem informal representa um conceito “definido como o produto da experiencia [sic] no desempenho de uma determinada função ou tarefa, não sendo portanto algo intencionalmente estruturado e controlado” (Cachapa, 2012, p. 8). Por isso mesmo sabermos, por exemplo, caminhar e correr, que é importante fecharmos a porta de casa para diminuir a probabilidade de assaltos ou aguardar que o sol, à semelhança do dia anterior, continue a existir e a permitir a vida no nosso planeta são conhecimentos tácitos que incorporamos no nosso dia a dia, possibilitando a atribuição de significados às nossas rotinas e aos fenómenos da realidade social.

Para além do nosso papel ativo nessa produção de símbolos culturais os processos de socialização nos quais nos envolvemos são cruciais para a criação e a disseminação de cosmovisões e a construção de uma linguagem partilhada. Para esse efeito a socialização primária, através de outros significativos, como familiares e outras figuras de proximidade, que estabelecem uma mediação entre a criança e o mundo (Berger, & Luckmann, 2004), torna possível a educação acerca das normas, dos valores e das práticas de um certo contexto temporal e sociocultural.

No entanto, numa visão crítica acerca do papel da família e da escola nas aprendizagens dos mais novos, é justo pensar nos pais ou avós como quem deve ter o maior protagonismo na sua definição? A escola é um local onde a troca e o confronto entre perspetivas deve acontecer, pois os estudantes trazem consigo bagagens sociais que são necessariamente diferentes, mas demonstrativas da diversidade e complexidade das relações humanas. Assim sendo, aquilo que muitas vezes a instituição familiar não consegue e, até, não deseja promover – o debate democrático de ideias e o contacto com outras situações de existência – é conseguido em âmbito escolar através da riqueza da pluralidade de visões e de professores diligentes e capazes de ter e fomentar uma consciência crítica acerca dos acontecimentos.

Será correto, então, continuarmos sequer a insistir na expressão “encarregados de educação”? São apenas os familiares aqueles a quem deve ser delegada a função de educar? A existência de instituições escolares e de políticas educativas não deveria ser suficiente para relembrarmos o caráter público que a educação também possui e, portanto, a necessária comparticipação que pais, avós, tios, assistentes operacionais, docentes, diretores e membros do Governo revelam e empreendem na definição das expectativas acerca dos conhecimentos adquiridos pelos educandos em determinadas fases da vida? Até quando se justificará a perpetuação do errado adágio a educação é em casa?

Não, aprender não se concretiza apenas em casa. Também na escola, também na rua, em qualquer sítio da nossa sociedade. Porque aprender conteúdos teóricos e questões de cidadania não podem consistir em processos separados e, muito menos, conflituantes. Porém, enquanto insistirmos na ideia de que a educação está principalmente outorgada à proximidade biológica, na defesa de que é ela que assegura a estabilidade emocional e formativa da criança ou do jovem, teremos muito mais dificuldades, mais tarde, em encontrar indivíduos que pretendam mobilizar-se em prol de causas coletivas, dado que não conhecerão muito mais do que apenas o ego arrogante assimilando as suas individualidades.

A escola não pode fazer milagres, mas constitui ainda um lugar onde são estimados o intercâmbio e a heterogeneidade da vida social. Valorizá-la não significa retirar poder à família, mas antes permitir que outras formas de ver as coisas sejam transmitidas e apreendidas pelos sujeitos que ainda estão a dar os primeiros passos na edificação da sua condição cidadã. A família é a iniciadora da educação, contudo, juntamente com a escola, torna-se a efetivadora desta. E nada melhor do que os mais pequenos sentirem que têm duas entidades de confiança com quem contar para o acompanhamento próximo do seu desenvolvimento.

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Este texto faz parte de uma série de textos de opinião de alunos do ensino secundário e superior sobre a sua visão do ensino e da educação.

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