Passados quatro anos, o País vê-se novamente “a braços” com as eleições autárquicas. Quatro anos depois, e num cenário extraordinário, os problemas mantém-se.
Não creio ser por mero acaso que, apenas no dia das eleições, coletivamente se crie uma consciência de que a abstenção é um problema real, sério, e que, segundo uma sondagem MetrisGFK/ICS/ISCTE, ronda entre os 45% e os 50%. Na prática, significa que, cerca de metade dos eleitores portugueses, deliberada ou forçosamente, escolhe não exercer o seu Direito de voto.
Num espiral vicioso, de forma cíclica, a abstenção é um fenómeno que tende a ser analisado de forma superficial. Prefere-se a troca de acusações nas redes sociais à reflexão coletiva sobre o porquê destes registos, nunca antes vistos.
Em primeiro lugar, devemos contextualizar o ano em que decorre este momento eleitoral. Em contexto pandémico, é previsível que as pessoas sintam medo de se expor fisicamente em locais de afluência; o que não se justifica é não serem garantidas as condições necessárias para aqueles que se deslocam às urnas. Ao mesmo tempo, desde as últimas eleições presidenciais, pouco ou nada foi feito para que estas condições fossem garantidas.
A literacia política é, talvez, um dos ponto-chave que mais atenção merece tendo em conta a realidade portuguesa. Entendo que muitos considerem as eleições autárquicas como eleições de proximidade, mas isso não mascara a falta de literacia política que se sente um pouco por toda a população portuguesa, por parte dos eleitores, dos que futuramente serão e, infelizmente, candidatos e eleitos. Não só a iliteracia política promove a abstenção, como cria votos desinformados.
Não nos esqueçamos do voto obsoleto. Sim, um voto que exige uma presença física no local de recenseamento. Não só esta condicionante impede que muitos estudantes votem, como restringe outros eleitores que se encontram deslocados. Embora estas situações estejam previstas por Lei, o voto antecipado não soluciona este problema, principalmente pela burocracia que exige – o eleitor deve dirigir-se ao presidente da câmara, com um comprovativo, e com uma antecedência entre 5 a 10 dias (20 dias, no caso dos estudantes).
Por fim, este artigo não se trata de uma discussão sobre se o voto é um Direito ou um Dever, que creio ser o que muitos, erradamente, pensam acerca da abstenção – que quem não vota é a ovelha negra da Nação, aquele que não tem em consideração a sua responsabilidade perante a Sociedade. Procura sim manifestar preocupações relativas às condições desajustadas em que as eleições decorrem, sendo elas autárquicas, presidenciais ou europeias e da falta de esforço das instituições públicas responsáveis para que este cenário se reverta. Em suma, deve entender-se a abstenção numa relação causa-efeito, sendo a abstenção o resultado de dinâmicas muito além daquilo que o fenómeno representa. Se não existir vontade de mudança, a abstenção nunca vai descer, muito menos extinguir-se. Para que a abstenção diminua, que se criem as condições!
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Este texto faz parte de uma série de textos de opinião de alunos do ensino secundário e superior sobre a sua visão do ensino e da educação.
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