Uma nova fase. Uma nova etapa. Uma mudança na tua vida. Vir para a faculdade é isso. É uma grande mudança, é vir para o desconhecido, muitas vezes para bem longe de casa, ficando muitas vezes sem a família. Família essa com quem estávamos habituados a estar 24/7, e que agora não está lá mais. Mãe, pai, avó ou avô, tio ou tia, quem quer que seja que fazia parte da tua casa, e agora não faz mais, porque TU tiveste que mudar de casa. De um dia para o outro tiveste de saber fazer comida, lavar a roupa e passar a ferro, arrumar a casa, ou quarto, estudar, e ainda no meio disso tudo ter tempo para ti. Vir para a faculdade não é fácil para ninguém, mas é mais fácil para quem vai à praxe.
Ir à praxe é ter e fazer parte de uma segunda família, uma família que somos nós que escolhemos, que está lá para nós, quando temos saudades realmente dos que estão longe, e que são família de sangue. Ter uma família académica, foi sem duvida a melhor coisa que a praxe me deu.
A praxe “nesta terra afamada (…) que é o Estoril”, é feita de maneira diferente daquela que tantas vezes anda nas bocas do mundo, mas foi a praxe que me foi feita, é a praxe que conheço, mas acima de tudo é uma praxe bem-feita. É uma praxe que possibilita a cada caloiro a escolha de uma padrinho e madrinha, sem restrições a cursos ou anos. No Estoril, escolhemos alguém para nos acompanhar na nossa vida académica, um amigo para a vida. É o que tenho principalmente a dizer sobre os padrinhos que escolhi. Cinco pessoas extraordinárias, que escolhi dentro da praxe para me acompanharem nesta longa caminhada que é estudar no ensino superior. Infelizmente oiço colegas meus, caloiros, dizerem que já não se dão com os seus padrinhos, e que o laço se perdeu. E eu, “caloira burra que sou, e caloira burra que sempre serei” penso para os meus botões, como é que é possível? Como é que é possível, ter se perdido o laço, se não fossem os meus padrinhos, eu não tinha conseguido muito provavelmente passar o primeiro ano, nem era a pessoa que sou hoje. Cada um deles ensinou me uma coisa diferente, retirei de todos aquilo que achei necessário para hoje, ser a pessoa que sou, e a veterana que sou. Mas padrinho, ou madrinha, é que aquela pessoa, que nos ama e orgulha desde o primeiro segundo, quase como se irmãos mais novos fossemos, desde o momento em que nos dizem que sim. Madrinha ou Padrinho, é muito mais do que aquela pessoa que nos dá folhas de teste, quando nos esquecemos de as comprar, mas que na realidade parece uma papelaria, porque tem sempre tudo. Padrinho ou Madrinha, é muito mais do que aquela pessoa que
tem apontamentos para nos dar, e quando não tem, arranja, só para nos facilitar a adaptação à faculdade. Madrinha ou Padrinho, é muito mais do que aquela pessoa que nos dá casa para dormir, quando vimos de um rally tascas podres de bêbados, e quando acordamos no dia seguinte nem nos lembramos de como é que fomos parar “à casa da madrinha”. Madrinha ou Padrinho é aquela pessoa que mesmo que não tenha sempre um teto para nos oferecer, terá sempre uma capa, que nos aquecerá e nos fará sentir no melhor sitio do mundo. Madrinha ou Padrinho, é aquela pessoa que está sempre lá, seja na praxe ou na vida. E na praxe, mesmo quando nós pensamos que eles não estão lá, eles estão lá de longe ou de perto, estão sempre lá a ver nos, cheios de orgulho, porque vêm como nos estamos a divertir. Estão sempre lá, a ver-nos felizes e a triunfar, mas também a ver-nos cair, e quando assim é, são os primeiros a darem nos um ombro para chorar, e uma mão para nos puxarem de novo para cima.
Como vêm eu vivi e vivo as duas perspetivas, a de caloira, que sou e sempre serei, porque como se diz pela minha faculdade fora, “caloiro uma vez, caloiro para sempre”, e que tem padrinhos; E na perspetiva de veterana, de madrinha que sou com muito orgulho nas minhas crias. Tenho cinco padrinhos, como disse, e nunca nada me faltou, desde os ensinamentos, aos apontamentos. E destes, falo desde vestir o traje e do orgulho que sentimos enquanto recéns caloiros ao vesti-lo, como da parte de quem nos viu crescer enquanto caloiros e agora nos vê trajar, até aos sete passos da capa. E depois de passar para o lado dos que vestem de negro, percebo que, o melhor ano da minha vida académica já passou, foi o ano de caloira. Agora é tempo de olhar para os próximos, e neste caso, para as minhas crias e passar-lhes tudo o que me foi ensinado, e bem-ensinado.
Para mal ou bem destes cincos caloiros, escolheram a madrinha errada, escolheram a madrinha mais galinha e mais babada. De trás, de lado, quando olho para eles na praxe, e os vejo gritar, o grito da faculdade, ou as musicas da praxe, sinto uma enorme felicidade e um enorme orgulho, porque sei, que estão a conseguir retirar da praxe o melhor que a praxe tem para lhes dar, e que apesar de para o ano virem a sentir saudades, porque todos as sentimos, vão ter também um sentimento de missão cumprida. E todos nós sabemos, que o melhor ano é o de caloiro, o ano em que temos todos os veteranos preocupados connosco, porque a praxe nem sempre foi bem vista pelo país, por isso há que cuidar bem dos caloiros, há que os praxar bem, e honrar o nome da praxe.
E quando paras um segundo e olhas para trás e para a frente, num futuro e num passado que te rodeia, não queres nunca sair deste mesmo presente. Quando olhas para trás e vês os teus padrinhos finalistas, que vão deixar a faculdade dentro de meses, mas nunca vão deixar o teu coração. E depois olhas para a frente, vês os teus afilhados, criaturas que, mais do que nada nem ninguém, dependem de ti, como tu dependias dos teus padrinhos. É um orgulho e uma tristeza que se juntam num acumular de emoções. É orgulho pelos dois lados, é tristeza pelos mesmos dois. É orgulho porque sabes que fizeram contigo um bom trabalho, e porque sabes que os pequenotes, estão a fazer um bom trabalho também. É tristeza porque os mais velhos vão embora, mas isso significa que para o ano, quem vai abandonar as tuas crias és tu.
Ser finalista não deve ser fácil. Ser caloiro é sem duvida, o melhor ano da nossa vida académica, e a melhor coisa que a faculdade nos dá.
Mas ser aluno do segundo ano, é a pior coisa. É o impasse entre ser caloiro para uns, e veterano para outros. É ser o orgulho de uns, e o pilar de outros. É ser afilhada de uns, e Madrinha de outros. É poder cair à frente de uns, e ter que nos manter inteiros e sorridentes à frente de outros. É querer ficar debaixo da capa do padrinho, e dar a nossa capa ao afilhado. Ser veterano pela primeira vez, é ver a melhor coisa a acontecer nos e a cair do céu aos trambolhões no inicio do ano, e é ver o nosso mundo a desabar, devagar e lentamente, com o aproximar do final do ano, e ver, também, os nossos pilares a desaparecer. É ter tudo, e de repente não ter nada.
Mas ser aluno de segundo ano, também é a melhor coisa. Ter durante um ano, toda a família académica reunida, a que escolhemos, e a que nos escolheu a nós. É ter os padrinhos para pedir conselhos, porque mesmo enquanto veteranos eles serão os nossos pilares, e a seguir ir dar lições aos afilhados. É receber amor e carinho de alguém, e é dar amor e carinho a alguém. É ter os maiores jantares de família, com 40 pessoas numa casa, mas se fossemos a ver bem, se calhar vinha a faculdade toda. É ter tudo, e de repente não ter nada.
É ter tudo e não ter nada, porque tens de parar. Tens de parar por um segundo, e ver netos a terem relações com avós, como de sangue se tratassem. É parares um segundo e veres todo um conjunto de pessoas, unidas por 3 ou 4 gerações, a interagirem entre si, pessoas que são importantes para ti. Sim porque para além dos teus padrinhos e afilhados, não te podes esquecer dos teus irmãos de praxe, companheiros e cúmplices enquanto caloiros, que viveram as mesmas praxes, e agora vivem as mesmas aventuras como veteranos. E é ter tudo e não ter nada, porque sem dares conta, uns surgem tipo cogumelos, outros desaparecem tipo dente de leão quando vem o vento.
Ser aluno do segundo ano, numa faculdade onde os cursos duram 3 anos, é a melhor e a pior coisa. Eu sou aluna do segundo ano de uma faculdade com licenciaturas assim, e neste momento, a meio do segundo ano, após o melhor do meu ano, em que tive tudo, vejo chegar o pior do meu ano, em que sei que vou perder tudo aquilo que me fez o que sou hoje, que me fez veterana, mas que acima de tudo me fez melhor pessoa. Daqui a uns meses, vejo me sem nada.
Por isso, e a todos os alunos de segundo ano, como eu, amem os vossos padrinhos, passem esses valores aos vossos afilhados, e se fizeram bem o vosso papel, vão ter os vossos afilhados ao vosso lado, a darem vos um ombro, quando se virem sem nada, se não tiverem afilhados, não se preocupem. Uma família não é apenas feita de pais e filhos, é também feita de irmãos, tios e primos, que estão sempre com vocês de certeza, e melhor do que ninguém, saberão como vos ajudar e apoiar. Uma família académica em nada é diferente, por isso neste momento em que todos nós e nenhum de nós, tem tudo, e ao mesmo tempo não tem nada, unam-se tanto quanto aqueles que deixaram na vossa casa aquando a entrada para a faculdade, pois no fim do ano terão tantas saudades, quanto aquelas que têm agora dos da vossa casa.
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Este texto faz parte de uma série de textos de opinião de alunos do ensino secundário e superior sobre a sua visão do ensino e da educação.
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