A Bênção das Pastas

Acordar cedo a um Domingo nunca me pareceu tão aliciante! A preguiça fica reduzida a nada quando sabemos que o dia que nos espera é o da Bênção das Pastas. A multidão instalou-se bem cedo pela zona da Sé Nova e todos esperavam ansiosamente pelo começo da celebração. Fotógrafos e barraquinhas era o que dominava todo o largo. Até que entrámos.

De capa aos ombros, fitas dentro da pasta e cabeça erguida. Felizmente Farmácia tem o seu lugar na zona da frente, pelo que a panorâmica era boa. Sentadas no chão, por entre sapatos, capas e fitados de Direito, foi assim que começou a cerimónia. A fumaça espiritual de odor forte envolvia todos os estudantes de cada vez que era remexida a campânula que circulava pelo espaço, ouviam-se cânticos de perfeita sintonia que preenchiam as fileiras das batinas, as palavras fortalecedoras renovavam o espírito até dos mais distraídos e todos estavam ali feitos homens e mulheres depois de todo o percurso de caloiros e doutores, de angústias e medos, de indecisões e desilusões. Houve quem mexesse no cabelo para disfarçar as lágrimas, quem olhasse para o detalhado teto da Catedral para suster a sua emoção, houve quem lesse ali mesmo todas as suas fitas e sorrisse com o olhar para cada frase, quem tivesse os sapatos rasgados pela experiência mas um espírito jovem aos olhos da nossa mãe chamada Coimbra. Coragem, esperança, amor e sabedoria, era tudo aquilo que suportava aquele momento.



Até que se pediu que cada Faculdade erguesse as suas pastas e foi aí o auge! Muita emoção num momento só! Mostrávamos a Deus a nossa bênção e com todas as nossas forças abanávamos cada fita cheios de orgulho, unidos pelo espírito arrebatador e nostálgico que Coimbra nos proporciona. Unidos, também, pelo silêncio e pela refleção e, acompanhados de uma lágrima, sabíamos que ali pertencíamos e que tínhamos sido inexplicavelmente felizes. Cada fita que me batia com força no cabelo era um novo acordar para a realidade. Ainda ontem entrara receosa após as colocações e, agora, abanava cada fita de cada obstáculo ultrapassado, com os meus pais orgulhosos lá fora à minha espera, juntamente com um sol radiante que rimava com a nossa força interior, e com trombetas e órgãos de fundo a anunciar esta Boa Nova, como se toda a caminhada pela licenciatura tivesse sido ao som desta sinfonia e as notas fossem, agora, tocadas mais alto! Como se estes três anos tivessem sido três dias em que se escolheu uma profissão, se conheceram mundos e mundos e se deu sentido a uma vida. Toda aquela tempestade de sentidos me fizera acreditar para sempre na felicidade eterna, em finais felizes e em recomeços divinos. Pensar no que virá e abarcar sempre e cada vez mais conhecimento é a missão daqui para a frente. Eternos insatisfeitos, é aquilo que todos somos, e o sonho em comum a todos nós era o de um dia fazermos o que amamos e o que nos deixa feliz e, ainda assim, chamar-lhe trabalho.

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Este texto faz parte de uma série de textos de opinião de alunos do ensino secundário e superior sobre a sua visão do ensino e da educação.

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