Quando alguém me diz isto a minha vontade é de dizer “Poupe-me, minimamente, poupe-me” (como diz José Castelo Branco num dos seus vídeos) ou “Um bocadinho de por favor” (como diz a personagem Emílio da série portuguesa de 2006 Aqui não há quem viva).
Sou uma orgulhosa estudante de CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO depois de ter estado em Línguas e Humanidades no Ensino Secundário (com opcional bienal de MACS).
Antes de sequer explicar porque é que as ciências sociais são ciências e como surgiram (explicado na Parte 2 deste artigo), comecemos pelo básico: todas as áreas são importantes. Todas as disciplinas são importantes. Matemática, História, Física, Filosofia, Biologia, Sociologia, todas estas e muitas mais são importantes. Cada uma na sua área, com o seu objeto de estudo, com a sua finalidade, mas todas igualmente importantes.
Não foram as ciências tradicionais que inventaram a democracia nem a igualdade nem a liberdade. Foram as letras, as ciências sociais, essas áreas maltratadas e desvalorizadas das quais faço orgulhosamente parte. Porque ter um Licenciatura em Engenharia Aeroespacial ou em Física ou em Matemática é mais valorizado do que uma em História da Arte, Línguas Literaturas e Culturas e Jornalismo. Somos a ralé das ciências. Somos o filho bastardo ou o primo pobre desta grande família onde reinam as naturais, exatas e tradicionais.
Com isto, não estou de todo a dizer que as ciências tradicionais não merecem respeito. Aliás, merecem todo o meu respeito e admiração e a importância do seu contributo é indiscutível. Da mesma maneira, as ciências sociais e as letras também merecem respeito e admiração. Quando pensamos num ser humano, no mundo, numa sociedade, não podemos somente pensar nos grandes Físicos, nos grandes Biólogos, nos grandes Matemáticos (todos eles com grandes contributos para a mundo de hoje). Temos de pensar também nos grandes Filósofos, nos grandes Teólogos, nos grandes Escritores!
Um estudante que ingresse na área social ou das letras ou escolha Línguas e Humanidades no Secundário não é menos inteligente que os colegas de Ciências e Tecnologias ou de Economia. Quem me dera ter um euro por cada vez que ouvi que MACS é a matemática dos burros. Tinha dinheiro suficiente para pagar a minha licenciatura toda.
Isto não é uma competição para ver quem sofre mais. Isto não é uma competição para ver quem é mais inteligente (por muito que o pareça). Cursos diferentes têm métodos de avaliação diferentes, exigências diferentes, saídas profissionais diferentes, objetivos diferentes. E devemos escolher o que nos faz mais feliz. O que nos realiza mais pessoal e profissionalmente. E se estamos num curso mais acessível ou “fácil” qual é o mal? Porque é que só valorizamos o que é difícil e só reconhecemos valor naqueles que frequentam cursos “difíceis”?
Eu não sei fazer integrais, não sei quantos tipos de rochas existem, não me lembro como se resolvem funções e não me lembro da última vez que resolvi uma equação. Mas perguntem-me sobre Émile Durkheim, perguntem-me sobre Alexis Tocqueville, sobre Maquiavél, Platão, Thomas Moore, Judith Butler, Howard Becker, Max Weber, Magritte, Pandisky, Byung-Chul Han, Charles Morris, Michel Foucault, todas figuras da história que nas suas áreas contribuíram (e alguns ainda vivos contribuem) para enriquecer o nosso mundo com novas ideias e teorias que abalaram o pensamento humano. Ainda hoje sentimos (e estamos a sentir no caso daqueles que ainda felizmente estão vivos) o efeito das suas obras e perspetivas. Sociólogos, Politólogos, Filósofos, Artistas… Figuras cruciais para o desenvolvimento do pensamento e da sensibilidade humana. Não somos só corpo. Somos mente, somos seres sedentos de conhecimento e dignos de respeito seja qual for a nossa a escolha académica.
O grande problema de hoje é que só valorizamos o que não compreendemos ou o que achamos ser difícil. Como a matemática. Porque um aluno que acabe com o 17 a matemática é mais inteligente que o aluno que tenha tirado 20 a Desenho ou aluno que tenha tirado 20 a literatura.
Eu? Eu fico triggered de cada vez que ouço dizer que Ciências da Comunicação não são ciências e que ciências sociais é uma piada.
Somos diferentes, multifacetados e interessantes. Temos gostos e apetências diferentes. Querem ser médicos, geólogos, politólogos, jornalistas, artistas, escritores, antropólogos, físicos, biólogos, psicólogos, advogados, ou outra profissão? Sejam. Mas não sejam a pessoa que julga e desvaloriza a área do colega do lado só porque não a compreende e nos seus (errados) olhos não vê a sua utilidade.
(continuação em Parte 2)
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