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Dura praxis, sed praxis

A praxe. Aquele bicho-de- sete-cabeças criado pela comunicação social após o infeliz e trágico acontecimento do Meco. A praxe. Aquilo que era algo normal e tradicional numa universidade, virou algo “estúpido e humilhante” para todos os que ouvem falar dela. Enquanto antes não se via ninguém a criticar a praxe, hoje em dia todos têm algo a dizer contra a praxe. A praxe. Aquilo que todos sabem que existe, mas que quase ninguém experimentou para poder apontar o dedo. A praxe isto. A praxe aquilo. A praxe, a praxe, a praxe.

Para aqueles que falam mal da praxe, aqui fica um testemunho de alguém que já a experimentou e, que por acaso, gostou. De quem é esse testemunho? É meu, claro.

Entrei para a Escola Superior de Tecnologia de Abrantes em setembro ou outubro de 2014. Digo setembro ou outubro porque entrei em segunda fase e não me lembro em que mês foi. No dia em que fui lá realizar a matrícula perguntaram-me logo se eu queria participar nas praxes. A minha resposta? “Claro que quero”. Não tinha medo nenhum do que podia acontecer. Estava ciente do que poderia encontrar nas praxes. Mas era algo que eu queria. Para me integrar no ambiente, para conhecer pessoas e porque acima de tudo, aquilo iria ser engraçado.

Já nas praxes, a primeira coisa que ouvi foi: “Ninguém é obrigado a vir às praxes. Não estamos aqui para obrigar ninguém a fazer seja o que for”. O aviso foi feito, só ficou quem quis (e ainda fomos muitos). Durante as praxes levei com ovos, farinha, polpa de tomate, vinagre, misturas maradas, água, terra e até entrei numa fonte às tantas da noite. Fiz tudo e mais alguma coisa. Nunca me queixei de nada. Nunca senti que abusaram do poder comigo ou com qualquer outro caloiro. Se eu os respeitava, só tinham que me respeitar. Ri-me muito. Gritei imenso. Conheci imensa gente. E não morri (que é o mais importante).



A praxe é algo bom. É divertido e tem um propósito: integrar os novos alunos, os tais caloiros, no ambiente académico. A praxe serve para fazer amizades. Serve para ficarmos a conhecer a universidade ou politécnico em questão. Serve para conhecer a nova cidade em que nos encontramos. Serve para imensas coisas boas e nunca, mas mesmo nunca, para humilhar, enxovalhar e/ou faltar ao respeito.

Mas num certo dia, infelizmente, tudo mudou.

Em dezembro de 2015 algo trágico aconteceu: morreram estudantes universitários na praia do Meco. A culpa é de quem? Da praxe. Claro que só podia ser da praxe. Assim que a comunicação social ouviu esta “bomba” pôs mãos à obra. Alimentaram-se ideias de que a praxe é algo horrível, quando na verdade, a culpa é de quem praxa e de quem não conhece limites.

A culpa daqueles estudantes terem morrido não foi da praxe, mas sim de quem os praxou. A culpa de certos estudantes se sentirem mal nas praxes, não é da praxe, mas sim de quem os praxa. A verdade é essa. Infelizmente o que aconteceu e acontece nas praxes é motivo para a criticarem sem razões aparentes e o que dantes era algo bom para a integração dos novos alunos, hoje é bullying e errado.

Errado é esse pensamento que existe sobre a praxe. Erradas são as pessoas que falam da praxe com base no que veem ou ouvem na comunicação social e nunca experimentaram as praxes. Errado é muita coisa, mas não a praxe.

“A praxe é má. A praxe é humilhante. A praxe é bullying. Abusam do poder que têm. Implementam medo nos caloiros. A praxe nunca deveria existir.”

Volto a repetir: a praxe é um ritual de integração e não um circo. Quem praxa, mais propriamente a Comissão de Praxe e os veteranos, não tem por objetivo mal tratar ninguém, mas sim passar aos caloiros aquilo que aprenderam, como as tradições académicas e essas coisas todas. Ninguém é obrigado a participar. Ninguém é obrigado a fazer o que não quer.

Quem participa nas praxes deve fazê-lo de livre vontade e não sentindo-se na obrigação de o fazer. Se forem para lá de livre vontade vão sentir-se muito melhor nas praxes. Vão divertir-se muito mais.

A comunicação social quer passar uma má imagem das praxes e isso leva a um menor número de caloiros. É triste.

Dirijo-me agora aos caloiros. Vocês por acaso sabiam que os “trajes” de Hogwarts, da saga Harry Potter, são baseados nos trajes portugueses? Ou seja, parte da saga Harry Potter é baseada nas tradições académicas. Então eu pergunto: se até a escritora J. K. Rolling admira as tradições académicas portuguesas, porquê estragar a praxe que é outra tradição importante da vida académica?

Caloiros (e não só), por favor, não liguem ao que se diz sobre a praxe. Experimentem-na. Juro que não se vão arrepender. Vão divertir-se, conhecer novas pessoas e vão se ambientar na vida académica da vossa universidade ou instituto politécnico. Se experimentarem e não gostarem, pronto, acontece. Mas ao menos poderão “falar mal” de algo que já fizeram e não gostaram.

Acreditem que a praxe é das melhores coisas que se pode ter na vida académica. Isso, as bebedeiras e as amizades. Digo isto por experiência própria. A vida académica vai marcar, para sempre, a vossa vida por isso porque não aproveitá-la ao máximo?

Pensem nisso e depois venham falar comigo.

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Este texto faz parte de uma série de textos de opinião de alunos do ensino secundário e superior sobre a sua visão do ensino e da educação.

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