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Entrar de corpo inteiro


Recebeste a tão aguardada notícia: foste colocado numa das tuas várias opções dos cursos de ensino superior. Muitos parabéns! Se entraste no teu curso – Arquitetura, Filosofia, Sociologia, Biologia, Matemática, Engenharia Química, Direito, Ciências da Educação, Economia – seja ele qual for, é porque mereceste. Significa que te esforçaste nos últimos três anos, os quais, no teu caso, até foram atravessados por dificuldades notórias e de que todos nos lembramos: pandemia, insegurança, incerteza, aumento do custo de vida, ausência de expectativas positivas quanto ao futuro. Se agora te caiu na caixa de e-mail uma tão boa comunicação de que conseguiste aceder ao ensino superior, vai em frente! Tens ainda muito para dar e familiares, colegas, amigos e professores que acreditam no teu potencial. Tens-me a mim, até, que te escrevo este texto como alguém que já completou 5 anos de ensino superior (Licenciatura e Mestrado) e, portanto, sabe “ligeiramente” da experiência.

Agora estás nervoso, não é? Pouco sabes do que tens de fazer. A matrícula é uma obrigatoriedade, sim, mas e depois? O que há para conhecer? Que pessoas te irão acolher? Quando será o primeiro contacto com a primeira unidade curricular (vulgo “cadeira”), contexto em que entrarás numa sala com dezenas ou centenas de outros colegas que não conheces e um ou mais docentes que talvez temas?! Bem, vamos com calma. O ensino superior é como tudo na vida: uma coisa de cada vez e cada uma delas a seu tempo.

No momento em que entrares na tua instituição é provável que encontres alguns estudantes de anos superiores do teu curso que estarão precisamente lá para te darem algumas orientações. Com quase toda a certeza estarás demasiado ansioso para perguntar algo que consideres relevante. Mas, dentro do possível, tenta questionar um ou dois aspetos que te inquietam naquele exato momento. Ou três. Os teus colegas mais velhos saberão responder-te ou indicar-te quem possa fazê-lo. Para além disso, é possível que te convidem para uma prática por demais institucionalizada que toda a gente conhece: a praxe. Confesso, nunca experimentei porque apesar de até poder conhecer pessoas nesse cenário em dimensões que, noutros contextos, não conheceria, não me identifico com os princípios que sustentam a atividade (pelo menos, aqueles que obrigam a uma posição de inferioridade, ou seja, que existem em quase todas as praxes). No entanto, também não sou radical a ponto de te dizer “não vás, será horrível!”. Não, se desejares, vai e experimenta: só nos tornamos pessoas credíveis, com argumentos válidos, se nos dispusermos a conhecer minimamente as coisas. Só não te deixes cair na cantiga de esta ser a única maneira de criares amizades. A amizade não se encontra circunscrita a um único espaço, e não será o ensino superior, ambiente de ensino e aprendizagem sobre a própria vida, que te irá limitar nessa missão de encontrar outros que possam partilhar vivências contigo.

Além disso, as universidades e os politécnicos estão repletos de associações, núcleos e grupos de pessoas que se juntam em prol de atividades que apreciam. Desde a leitura e a escrita criativa ao desporto, e desde a partilha de conhecimentos dentro do próprio curso a acontecimentos de cultura e lazer fora dos portões das academias. Acima de tudo, terás muito com que contactar e em todos esses conjuntos e momentos identificarás gostos e pensamentos comuns.

Fica atento também às bolsas de estudo, nomeadamente a bolsa da ação social da Direção-Geral de Ensino Superior (DGES), pois se tiveres direito será decerto uma mais-valia para o pagamento de propinas e outras atividades em que queiras participar. Sem ela, eu, por exemplo, teria concluído com muito mais obstáculos os cursos em que estive. Para ti que, como eu, podes vir de um agregado familiar de classe popular e sem grau de ensino superior, acredita que também há lugar para ti. Não fosse o estudante com a melhor Licenciatura em Sociologia na Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP) no ano de 2020, em pleno período pandémico, quem está a falar contigo (18 valores – tudo é possível!), não estaria a dizer-te isto.

E, acima de tudo, vive! Entra de corpo inteiro, com tudo o que tens para dar. Não te deixes prender por um estudo exagerado que só leva a momentos de autodesvalorização nem vejas as festas como a única virtude dos próximos 3 ou mais anos. Nem 8 nem 80, neste espaço de números existirá toda uma gama de experiências que permitem moldar o que será o teu caminho no ensino superior; e dele deves retirar o que entenderes ser melhor para a tua formação – enquanto estudante, futuro profissional, cidadão e pessoa.

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Este texto faz parte de uma série de textos de opinião de alunos do ensino secundário e superior sobre a sua visão do ensino e da educação.

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