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- 28 Setembro 2015
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Para quem quer seguir o curso de Medicina Veterinária seria interessante lerem este artigo publicado na revista "Veterinária Atual" sobre empregabilidade na Portugal e na Europa.
Deixo uma pergunta no ar: Será que por amor aos animais vale a pena investir 6 anos a estudar, a tirar um curso para depois da sua conclusão não termos emprego ou se tivermos a sorte de conseguir entramos em depressão, burnout, devido à pressão e precárias condições de trabalho, etc...??
Empregabilidade e demografia veterinária: uma perspetiva europeia
Paulo Alexandre Gomes Pereira e Emir M. Chaher
(Fonte Revista Veterinária Atual)
Recentemente, a Federação de Veterinários da Europa (FVE), consciente das mudanças no panorama veterinário europeu no que respeita ao Médico Veterinário, e da rápida mudança das suas condições profissionais e sociais, decidiu realizar um estudo (survey) que pudesse colocar em perspetiva o quadro global e as particularidades nacionais da demografia e empregabilidade veterinária na Europa. Já os EUA haviam anteriormente procedido a semelhante estudo, essencial a uma planificação estratégica para a profissão.
O estudo FVE abrangeu a quase totalidade dos países que compõem a mesma, bem como outros países. No total estima-se que existam cerca de 243 mil Médicos Veterinários nos países abrangidos pelo estudo, correspondente a 3.8 Médicos Veterinários por cada 10 mil habitantes. Estima-se haver 157 milhões de animais de companhia e 342 milhões de animais de produção e equinos nos mesmos países. O número de membros ativos indicado inicialmente por Portugal para este estudo foi de 5000, mas os dados atuais apontam um valor de 5504 membros ativos, pelo que a situação ainda é mais grave no que respeita ao excesso de oferta veterinária em Portugal.
Temos atualmente no nosso país acima de 5,3 Médicos Veterinários por cada 10 mil habitantes, o que representa 80% mais Médicos Veterinários por habitante que a média da França, Reino Unido e Alemanha, países com um PBI duas vezes superior ao de Portugal. Se continuarmos esta tendência, em dez anos iremos ter 120% mais Médicos Veterinários por habitante que estes três países e em 20 anos iremos ter duas vezes e meia mais Médicos Veterinários por habitante.
O estudo FVE aponta claramente tanto a tendência para o excesso de oferta de Médicos Veterinários em Portugal, como os efeitos negativos do mesmo. De uma forma geral, encontramos dois tipos de países com excesso de Médicos Veterinários:
A forma como se deve proceder a uma reversão do status quo não é imediatamente evidente e sujeitável a critérios arbitrários. Enquanto todas as Faculdades de Medicina Veterinária referem publicamente uma empregabilidade de quase 100%, os dados do Ministério da Educação apontam para valores de até 7% de desemprego, dependendo da escola. O ensino de Medicina Veterinária em Portugal deve ser abordado nas vertentes quantitativa, mas também qualitativa, para isso é vinda em boa hora a avaliação nacional dos cursos pela A3ES (Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior) a decorrer atualmente.
Sinais e efeitos negativos do excesso de médicos veterinários em Portugal, quando comparados com outros países europeus
Análise dos Dados do FVE Survey of the Veterinary Profession in Europe 2015
1 – A percentagem da população de médicos veterinários com menos de 40 anos é a maior da europa – 76% contra a média europeia de 44%.
2 – A percentagem de mulheres médicas veterinárias é a 4ª mais elevada da europa, 62% contra a média de 53%; dado que a percentagem atual de estudantes e recém-graduados demonstra a prevalência de maiores quantidades de profissionais do sexo feminino, parece confirmar a tendência;
3 – A nível de experiência profissional, Portugal aparece tanto com tendo a 2ª maior percentagem de veterinários com menos de dois anos de experiência, como a menor percentagem de Médicos Veterinários com mais de 15 anos de experiência. Isso parece demonstrar a mudança a passo acelerado e a inversão da pirâmide demográfica dos veterinários em Portugal; sendo que aponta para o risco de rapidamente termos as gerações vindouras a serem treinadas por colegas de menor experiência que no passado e a consequente perda de qualidade no ensino.
4 – O desemprego atinge os 5% em Portugal, contra a média de 3% na europa e os 8% em Espanha. Dos desempregados identificados no Estudo, metade encontra-se nessa situação há mais de um ano.
5 – O subemprego em Portugal (34%) apenas é ultrapassado por alguns países do leste da Europa, muitos dos quais também referenciados como tendo problemas de excesso de Médicos Veterinários.
6 – Se combinarmos os valores de desemprego e subemprego em Portugal, obtemos 40%, o dobro de Espanha.
7 – O estudo parece identificar uma relação direta entre a oferta excessiva de veterinários com os piores valores de reputação da classe: Portugal aparece com a 8ª pior reputação pública e a 7ª pior entre os respetivos Clientes, acompanhado nesses lugares pelos outros países com maior número de Médicos Veterinários por habitantes.
8 – A produtividade por Médico Veterinário em prática privada em Portugal representa 1/5 da média europeia, apenas inferior em países como Bulgária, Macedónia, Letónia, Roménia ou Eslováquia.
9 – Portugal apresenta a maior dependência do sector de clínica de animais de companhia neste estudo – 94%, aquando da divisão por espécies.
10 – O valor médio de salário para médicos veterinários em animais de companhia em Portugal é de 14 mil euros, superior apenas à Bulgária, Roménia e Sérvia.
11 – 58% dos médicos veterinários em Portugal não apresentam plano de reforma, apenas 18% dos inquiridos acredita que tem um plano adequado às suas necessidades.
12 – Os índices de satisfação com a profissão são dos mais baixos do estudo (o pior para a escolha de carreira, 2º pior para o salário, o pior para qualidade de vida, 4º pior para ambiente de trabalho e o pior quando inquirido se voltaria a enveredar por esta profissão). Um estudo recente liga estes fatores a stresse, depressão e burnout (VetBizz 2015);
13 – O número de dias de férias é apenas menor na Bélgica e em países do Leste Europeu.
14 – Nos últimos três anos, 23% dos inquiridos trabalhou efetivamente no estrangeiro e 66% considerou seriamente fazê-lo.
15 – 46% dos veterinários em Portugal não tem Seguro de Responsabilidade Profissional.
16 – A frase com que os inquiridos portugueses mais concordaram – dentro de um conjunto apresentado – foi: “Existem demasiados novos graduados a sair dos cursos de veterinária”.
Este estudo levanta questões diversas:
1 – O excesso de oferta de Médicos Veterinários em Portugal, num ambiente económico adverso, com evidentes repercussões sobre as condições de trabalho;
2 – O desemprego e o subemprego – a necessidade urgente de entender os efeitos reais na população veterinária, corroborada por relatos de dificuldades sociais objetivas sentidas por membros da profissão;
3 – A necessidade de estudar este tema de forma aprofundada e de criar uma estratégia para a Classe;
4 – As repercussões na qualidade do contributo dos Médicos Veterinários para a sociedade, em virtude do excesso destes e, em resposta, a alteração na perceção da sociedade da imagem dos Médicos Veterinários;
5 – O futuro da qualidade do ensino em Portugal, demonstrada a diminuição acentuada da percentagem de Médicos Veterinários experientes;
6 – A quantificação de emigração e do custo para a sociedade da formação de quadros superiores que saem do país.
Se não pretendemos ser uma Classe de técnicos de saúde animal, temos que liderar a luta pelo bem-estar animal e para isso temos de apresentar as mais-valias do nosso trabalho à sociedade.
“Esta casa não pode apenas formar técnicos de saúde animal, tem de ser capaz de formar doutores”
Deixo uma pergunta no ar: Será que por amor aos animais vale a pena investir 6 anos a estudar, a tirar um curso para depois da sua conclusão não termos emprego ou se tivermos a sorte de conseguir entramos em depressão, burnout, devido à pressão e precárias condições de trabalho, etc...??
Empregabilidade e demografia veterinária: uma perspetiva europeia
Paulo Alexandre Gomes Pereira e Emir M. Chaher
(Fonte Revista Veterinária Atual)
Recentemente, a Federação de Veterinários da Europa (FVE), consciente das mudanças no panorama veterinário europeu no que respeita ao Médico Veterinário, e da rápida mudança das suas condições profissionais e sociais, decidiu realizar um estudo (survey) que pudesse colocar em perspetiva o quadro global e as particularidades nacionais da demografia e empregabilidade veterinária na Europa. Já os EUA haviam anteriormente procedido a semelhante estudo, essencial a uma planificação estratégica para a profissão.
O estudo FVE abrangeu a quase totalidade dos países que compõem a mesma, bem como outros países. No total estima-se que existam cerca de 243 mil Médicos Veterinários nos países abrangidos pelo estudo, correspondente a 3.8 Médicos Veterinários por cada 10 mil habitantes. Estima-se haver 157 milhões de animais de companhia e 342 milhões de animais de produção e equinos nos mesmos países. O número de membros ativos indicado inicialmente por Portugal para este estudo foi de 5000, mas os dados atuais apontam um valor de 5504 membros ativos, pelo que a situação ainda é mais grave no que respeita ao excesso de oferta veterinária em Portugal.
Temos atualmente no nosso país acima de 5,3 Médicos Veterinários por cada 10 mil habitantes, o que representa 80% mais Médicos Veterinários por habitante que a média da França, Reino Unido e Alemanha, países com um PBI duas vezes superior ao de Portugal. Se continuarmos esta tendência, em dez anos iremos ter 120% mais Médicos Veterinários por habitante que estes três países e em 20 anos iremos ter duas vezes e meia mais Médicos Veterinários por habitante.
O estudo FVE aponta claramente tanto a tendência para o excesso de oferta de Médicos Veterinários em Portugal, como os efeitos negativos do mesmo. De uma forma geral, encontramos dois tipos de países com excesso de Médicos Veterinários:
- Os do Sul da Europa, claramente Portugal, Espanha e Itália;
- Alguns países do Leste da Europa, nomeadamente Bulgária, Sérvia, República Checa, Roménia, FYROM (Macedónia), Letónia e, em alguma medida, a Polónia.
A forma como se deve proceder a uma reversão do status quo não é imediatamente evidente e sujeitável a critérios arbitrários. Enquanto todas as Faculdades de Medicina Veterinária referem publicamente uma empregabilidade de quase 100%, os dados do Ministério da Educação apontam para valores de até 7% de desemprego, dependendo da escola. O ensino de Medicina Veterinária em Portugal deve ser abordado nas vertentes quantitativa, mas também qualitativa, para isso é vinda em boa hora a avaliação nacional dos cursos pela A3ES (Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior) a decorrer atualmente.
Sinais e efeitos negativos do excesso de médicos veterinários em Portugal, quando comparados com outros países europeus
Análise dos Dados do FVE Survey of the Veterinary Profession in Europe 2015
1 – A percentagem da população de médicos veterinários com menos de 40 anos é a maior da europa – 76% contra a média europeia de 44%.
2 – A percentagem de mulheres médicas veterinárias é a 4ª mais elevada da europa, 62% contra a média de 53%; dado que a percentagem atual de estudantes e recém-graduados demonstra a prevalência de maiores quantidades de profissionais do sexo feminino, parece confirmar a tendência;
3 – A nível de experiência profissional, Portugal aparece tanto com tendo a 2ª maior percentagem de veterinários com menos de dois anos de experiência, como a menor percentagem de Médicos Veterinários com mais de 15 anos de experiência. Isso parece demonstrar a mudança a passo acelerado e a inversão da pirâmide demográfica dos veterinários em Portugal; sendo que aponta para o risco de rapidamente termos as gerações vindouras a serem treinadas por colegas de menor experiência que no passado e a consequente perda de qualidade no ensino.
4 – O desemprego atinge os 5% em Portugal, contra a média de 3% na europa e os 8% em Espanha. Dos desempregados identificados no Estudo, metade encontra-se nessa situação há mais de um ano.
5 – O subemprego em Portugal (34%) apenas é ultrapassado por alguns países do leste da Europa, muitos dos quais também referenciados como tendo problemas de excesso de Médicos Veterinários.
6 – Se combinarmos os valores de desemprego e subemprego em Portugal, obtemos 40%, o dobro de Espanha.
7 – O estudo parece identificar uma relação direta entre a oferta excessiva de veterinários com os piores valores de reputação da classe: Portugal aparece com a 8ª pior reputação pública e a 7ª pior entre os respetivos Clientes, acompanhado nesses lugares pelos outros países com maior número de Médicos Veterinários por habitantes.
8 – A produtividade por Médico Veterinário em prática privada em Portugal representa 1/5 da média europeia, apenas inferior em países como Bulgária, Macedónia, Letónia, Roménia ou Eslováquia.
9 – Portugal apresenta a maior dependência do sector de clínica de animais de companhia neste estudo – 94%, aquando da divisão por espécies.
10 – O valor médio de salário para médicos veterinários em animais de companhia em Portugal é de 14 mil euros, superior apenas à Bulgária, Roménia e Sérvia.
11 – 58% dos médicos veterinários em Portugal não apresentam plano de reforma, apenas 18% dos inquiridos acredita que tem um plano adequado às suas necessidades.
12 – Os índices de satisfação com a profissão são dos mais baixos do estudo (o pior para a escolha de carreira, 2º pior para o salário, o pior para qualidade de vida, 4º pior para ambiente de trabalho e o pior quando inquirido se voltaria a enveredar por esta profissão). Um estudo recente liga estes fatores a stresse, depressão e burnout (VetBizz 2015);
13 – O número de dias de férias é apenas menor na Bélgica e em países do Leste Europeu.
14 – Nos últimos três anos, 23% dos inquiridos trabalhou efetivamente no estrangeiro e 66% considerou seriamente fazê-lo.
15 – 46% dos veterinários em Portugal não tem Seguro de Responsabilidade Profissional.
16 – A frase com que os inquiridos portugueses mais concordaram – dentro de um conjunto apresentado – foi: “Existem demasiados novos graduados a sair dos cursos de veterinária”.
Este estudo levanta questões diversas:
1 – O excesso de oferta de Médicos Veterinários em Portugal, num ambiente económico adverso, com evidentes repercussões sobre as condições de trabalho;
2 – O desemprego e o subemprego – a necessidade urgente de entender os efeitos reais na população veterinária, corroborada por relatos de dificuldades sociais objetivas sentidas por membros da profissão;
3 – A necessidade de estudar este tema de forma aprofundada e de criar uma estratégia para a Classe;
4 – As repercussões na qualidade do contributo dos Médicos Veterinários para a sociedade, em virtude do excesso destes e, em resposta, a alteração na perceção da sociedade da imagem dos Médicos Veterinários;
5 – O futuro da qualidade do ensino em Portugal, demonstrada a diminuição acentuada da percentagem de Médicos Veterinários experientes;
6 – A quantificação de emigração e do custo para a sociedade da formação de quadros superiores que saem do país.
Se não pretendemos ser uma Classe de técnicos de saúde animal, temos que liderar a luta pelo bem-estar animal e para isso temos de apresentar as mais-valias do nosso trabalho à sociedade.
“Esta casa não pode apenas formar técnicos de saúde animal, tem de ser capaz de formar doutores”
- Professor Carvalho Varela – excerto da aula inaugural do curso 1990-1995 da Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade Técnica de Lisboa