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Se um exercício deste género surgisse num momento de avaliação, e se eu desse a minha primeira resposta, garantidamente que não teria a cotação completa. É certo que, dependendo dos critérios e/ou do avaliador, o desconto poderia não ser muito significativo, mas não a teria. Admitindo, como me parece ser o único pressuposto legítimo para a existência de momentos de avaliação, que o objectivo seria aferir o meu conhecimento matemático, e tendo em conta, como tentei justificar antes, que em momento algum da minha resolução errada houve sinais de verdadeiro desconhecimento matemático, será desejável que assim seja? Será lícito considerar-se que o meu conhecimento matemático é menos completo por causa disso?
Quis dar uma resposta ponderada a esta observação e por isso não lhe respondi imediatamente, mas acho que já estou em condições de o fazer.
Em primeiro lugar, eu diria que não há instrumentos de avaliação perfeitos. Não existe, pura e simplesmente, uma maneira completamente fiável de aferir o conhecimento que um aluno adquiriu sobre um determinado assunto. Tudo o que podemos fazer é propor uma tarefa ao aluno e verificar quão próximo este ficou de atingir o(s) objectivo(s) dessa tarefa. Podemos conceber tarefas que sirvam de instrumentos de avaliação mais ou menos adequados, isto é, tarefas cuja resolução reflicta mais ou menos fielmente o conhecimento do aluno sobre determinado assunto ou a capacidade do aluno em determinado domínio, mas haverá sempre factores extrâneos a esse conhecimento ou capacidade que podem ter um impacto no desempenho do aluno nessas tarefas.
(Dito isto, eu continuo a ser razoavelmente optimista em relação à possibilidade de aperfeiçoar os instrumentos de avaliação de modo a que estes forneçam uma aferição o mais fiável e justa possível dos conhecimentos e competências dos alunos. Eu tenho as minhas ideias sobre como fazer isso, mas não sou um especialista no assunto. Em breve terei mais conhecimento de causa, uma vez que a avaliação é um dos tópicos sobre os quais o mestrado que vou fazer incide.)
Eu diria que, tendo isto em conta, o que devemos fazer é conceber instrumentos de avaliação que, tanto quanto possível, eliminem os factores que não estão directamente relacionados com o objectivo da avaliação e que possam ter um impacto no desempenho de quem é avaliado. Mas, ainda que isso seja feito, não me parece possível que todos esses factores sejam eliminados. Portanto, ainda que, como dizes, o objectivo de uma avaliação seja aferir o teu conhecimento matemático, esse objectivo só é plenamente atingido em teoria; em qualquer situação prática de avaliação, há o risco de o desempenho do aluno ser influenciado por erros ou distracções como a que exemplificaste.
Se o erro do aluno é passível de ser identificado inequivocamente como uma distracção e não tem um impacto significativo na possibilidade de aferição da capacidade do aluno para realizar a tarefa em causa, então podemos ignorar esse erro. Por exemplo, se um aluno cometer um erro na transposição dos dados de um problema matemático, substituindo um 3 por um 5, e essa transposição incorrecta não afectar nem a dificuldade da tarefa proposta, nem o desempenho do aluno na mesma, quem avalia pode escolher ignorar esse erro e considerar que o aluno cumpriu com sucesso o que lhe foi proposto.
Mas há, parece-me, uma segunda possibilidade, nomeadamente a possibilidade de os tais factores extrâneos não serem irrelevantes para a avaliação em causa. Um exame de matemática, por exemplo, pode servir para avaliar não apenas conhecimento matemático, mas também um conjunto de competências consideradas importantes: a atenção ao detalhe, a destreza de cálculo, entre outras. Se se considerar que aquele instrumento de avaliação tem também o objectivo de aferir este tipo de competência, então o conhecimento matemático deixa de ser o único aspecto em avaliação e erros de outra natureza podem ser relevantes. É claro que podemos argumentar que, mesmo que tal seja o caso, poderão existir ainda outros erros que não são nem matemáticos nem deste outro tipo e que, por isso, não devem ser considerados; penso que esta situação cabe naquilo que descrevi no parágrafo anterior.
Uma questão diferente daquela que tenho estado a abordar é a questão da classificação. Parece-me ser essa a tua principal preocupação aqui. Afinal, se a avaliação fosse inteiramente qualitativa e o feedback recebido pelo aluno ocorresse na forma de comentários do professor em vez de um número numa escala (de 0 a 20, por exemplo), os problemas anteriores não desapareceriam, mas teriam um impacto prático diferente do que efectivamente têm.
Parece-me que podemos mitigar o impacto deste tipo de situação na classificação do aluno apenas na medida em que conseguirmos identificar correctamente os erros cometidos como sendo situações de um ou outro dos dois tipos que identifiquei acima. Se o aluno se distrai e comete um erro que altera drasticamente a natureza da tarefa proposta e esta deixa de permitir aferir o conhecimento do aluno, então isso tem necessariamente de ter, infelizmente, um impacto negativo na classificação. Se o aluno comete um erro que não afecta a aferição do seu conhecimento, mas revela insuficiências noutras competências que se julgam relevantes, então isso também terá um impacto negativo (porventura de menor magnitude) na classificação do aluno. O impacto na classificação só será nulo (ou, pelo menos, extremamente reduzido) no caso em que o erro é de tal natureza e tem um efeito de tal modo pequeno na capacidade de aferir as competências do aluno que pode ser ignorado.
Em suma (porque esta reflexão entretanto assumiu proporções preocupantes): não há instrumentos de avaliação ou classificação perfeitos e é necessário procurar um equilíbrio entre a fiabilidade e a justiça destes, por um lado, e a possibilidade da sua aplicação prática, por outro. Podemos tentar mitigar o efeito do tipo de erros a que te referes, mas, em última análise, temos de conseguir aprender a viver com a possibilidade de falhas nossas, ainda que involuntárias, terem um impacto nas nossas vidas. Momentos de avaliação não escapam a este facto.