Greve Estudantil pelo Clima: “Estamos a lutar pelo nosso futuro porque os adultos não se preocupam connosco”


27 cidades portuguesas aderiram à Greve Climática Estudantil. Do Norte ao Sul do país, passando pelas regiões autónomas, viveu-se intensamente o protesto pela mitigação das alterações climáticas. Mas não só nas grandes cidades proliferou a luta contra a inércia política: em Paço de Arcos, Oeiras, esta sexta foi feita de futuro.

“Somewhere over the rainbow / Bluebirds fly / And the dreams that you dream of / Dreams really do come true” – no Jardim da Praceta Dionísio Matias, ouvia-se a canção que personifica a esperança que os jovens possuem de construir um mundo melhor. Bruno Sousa, de 11 anos, envergava uma indumentária verde e um trevo adornava a sua camisola. No cartaz que segurava, podia ler-se: “Faz o efeito de estufa acalmar e o mundo melhor ficar”. Questionado acerca dos motivos que o levaram a juntar-se à tão aclamada greve, o aluno do 6º ano foi assertivo: “É um dia importante para que as pessoas percebam que não podem continuar a brincar com o ambiente”.

O verbo brincar não rima com ambiente (nem literal nem metaforicamente) e foi isso que a ativista sueca Greta Thunberg, de apenas 16 anos, compreendeu em agosto de 2018. Frequentando o 9º ano e apercebendo-se dos incêndios e das vagas de calor que assolavam a Suécia, decidiu faltar às aulas até que o governo tomasse medidas no sentido de reduzir as emissões de gases com efeito de estufa (como o dióxido de carbono).



Sentada do lado de fora do parlamento sueco, durante o horário escolar e com um cartaz onde se lia Skolstrejk för klimatet (greve escolar pelo clima), apelou a que o Acordo de Paris fosse respeitado, pois no plano de ação para 2016, já devia ter sido implementado “um desenvolvimento hipocarbónico e resiliente às alterações climáticas”.

Um grupo de alunas do 7º ano, entre os 12 e os 15 anos, conversava perto dos canteiros verdejantes do jardim. Entre expressões faciais menos alegres e palavras não tão agradáveis, Joana (nome fictício) revelou o motivo da sua insatisfação: “Há pessoas que poluem o ambiente sem terem noção disso. Há bocado, passou um senhor por aqui e atirou um cigarro para o chão. Viu-nos, leu as mensagens nos nossos cartazes e fez aquilo que faz todos os dias”.

Mas que hábitos devemos adotar no nosso quotidiano para perpetuar o legado de Greta? Na perspetiva de Beatriz (nome fictício), a resposta é fácil: “Lutar até que alguém nos oiça”. A adolescente sabe que a produção de combustíveis fósseis e o poder andam de mãos dadas; não se esquece de que os protocolos, as leis e os acordos são ratificados mas nunca respeitados e que os mais ricos acreditam que o colapso ambiental somente atingirá os financeiramente débeis. Contudo, não deixa de afirmar: “Muitas pessoas veem-nos e pensam: ‘Que bonitos’, mas não é essa a questão. Estamos a lutar pelo nosso futuro porque os adultos não se preocupam connosco.”

Na 29ª semana das #FridaysForFuture, Greta declarou: “Eu só cheguei na hora certa. Cada vez mais pessoas têm consciência da situação de emergência em que vivemos, do facto de que estamos a atravessar uma crise existencial que nunca foi abordada dessa forma”. O segredo para o sucesso? A jovem sueca dá voz a quem não a tem, a quem ainda não a descobriu e a quem a tem mas não sabe como se fazer ouvir. Naquilo que toca à causa ambiental, Marta segue o seu exemplo cegamente: “Temos de perceber a missão da Greta. Se todos contribuirmos, nem que seja um pouco, conseguiremos mudar o futuro. Estamos aqui para lutar.”

Uma luta que, muitas das vezes, pode parecer inglória. Os efeitos do aquecimento global são devastadores e crescentes, como o aumento do nível do mar, a redução do gelo no Ártico, as condições meteorológicas adversas, os ciclones tropicais, o clima desfasado relativamente às estações do ano ou a redução dos níveis de oxigénio.

Se não existe um planeta B, não devemos proteger o único que temos? Para Carolina (nome fictício), participar num movimento “tão importante” pode funcionar como uma advertência em grande escala: “Isto não acontece muitas vezes, ou seja, reunir um número tão grande de pessoas para participar em algo maior”. Por outro lado, Sónia (nome fictício) destaca a necessidade de consciencializar os mais velhos para a problemática ambiental: “Os adultos não fazem reciclagem, deitam lixo ao mar e isso tem consequências. Por exemplo, há peixes que são encontrados mortos com resíduos no corpo. Temos de mudar isso.”

Mudar é a palavra de ordem para os estudantes da Escola Básica Integrada Dr. Joaquim de Barros. Palavra que lhes foi incutida por Ana Charais, professora de Educação Moral e Religiosa e precursora da greve pelo clima no Agrupamento de Escolas de Paço de Arcos. Preso à t-shirt, levava um pin com a inscrição “Defensor do Planeta” e, na cara, um sorriso contagiante, dizendo: “Acho importantíssimo que os mais novos exprimam a sua opinião. No fundo, o futuro é deles. Neste caso, com os mais pequenos, alguém tem de permitir a sua movimentação. O papel dos adultos é promover pequenos gestos porque, sozinhos, é difícil fazermos algo, mas juntos mudamos muitas coisas”. No entanto, Ana relembra que, sozinha, Greta movimentou milhões de estudantes.

Na escola, a professora começou por ler discursos da adolescente sueca aos estudantes para perceber que reações tinham. Numa fase posterior, desenvolveram uma reflexão conjunta que foi reproduzida nos cartazes que transportaram até ao centro da vila.

“Estas pequenas grandes coisas, que fazemos pontualmente, servem para acordar. Há miúdos com tanto entusiasmo que temos a certeza de que influenciarão os pais. As crianças têm muita força na transmissão do testemunho”, realçou a docente.

Um testemunho constituído por força, vontade de chegar mais longe, coragem para fazer os trabalhos de casa de quem se esqueceu e tentar inverter uma tragédia gritante e capacidade de união para responder a um dos maiores desafios que a humanidade já enfrentou.

“Someday I’ll wish upon a star / Wake up where the clouds are far behind me” – será que, um dia, acordaremos e as nuvens estarão longe? Há uma receita com três ingredientes para que o resultado final seja esse: ativismo, ação política e boa comunicação. As sextas tornar-se-ão em todos os dias da semana e, assim, veremos o arco-íris.