O grupo de trabalhadores mais penalizado pela contenção e pelos cortes salariais praticados pelas empresas em Portugal entre 2006 e 2020 é o dos licenciados e mestres (pessoas com ensino superior), indica um estudo do Banco de Portugal (BdP), divulgado esta segunda-feira. Os licenciados destacam-se pela negativa, pois tiveram a maior desvalorização salarial real (descontando o efeito da inflação) neste período em análise.
De acordo com um tema do boletim económico de março intitulado “A distribuição dos salários em Portugal no período 2006-2020”, estudo que foi agora pré-publicado, os trabalhadores com ensino superior ganhavam, em média, 1745 euros em 2006 (descontando já a inflação), mas chegaram a 2020 com menos 134 euros em termos reais (isto é, descontando já o efeito da inflação, que foi relativamente baixa neste período).
Ou seja, o salário médio dos mais qualificados desvalorizou-se efetivamente quase 8%. Este grupo passou a ganhar, em média, 1611 euros mensais.
Como referido, o ensino superior é composto por dois subgrupos: trabalhadores com licenciatura/bacharelato e trabalhadores com mestrado.
Entre os licenciados, o corte salarial é muito significativo: foi de quase 9%. Estes diplomados ganhavam, em 2020, menos 152 euros do que em 2006, ou seja, 1592 euros.
No grupo dos que têm mestrado, o corte real foi de 5% (menos 89 euros), estando a ganhar 1662 euros em média.
Pessoas com secundário também não evitaram desvalorização
Mas a compressão salarial imposta pelas empresas estende-se a outros menos qualificados.
O salário médio real dos trabalhadores com ensino secundário também recuou desde 2006 (menos 45 euros ou menos 4,1%), fixando-se nos 1047 euros em 2020.
Assim foi, sobretudo, devido ao efeito de atualização persistente do salário mínimo, que puxou para cima os níveis salariais destes menos qualificados, onde o ordenado mínimo tende a ser mais prevalecente.
Efeito subida do salário mínimo
O Banco de Portugal destaca “a percentagem mais alta de trabalhadores que auferem a retribuição mínima mensal garantida” em grupos como a população com o ensino básico.
“Para além do efeito da retribuição mínima mensal garantida, esta dinâmica salarial reflete o maior crescimento da oferta de emprego com maiores qualificações, num período caracterizado por importantes alterações demográficas e por um aumento expressivo da escolaridade”, acrescenta o Banco de Portugal.
Portanto, só os menos qualificados (com ensino básico ou inferior) é que escaparam à forte desvalorização do fator trabalho que assolou a economia portuguesa nestes anos em análise pelos economistas do banco central.
O salário médio de pessoas com o ensino básico subiu quase 14% (mais 109 euros), para os 910 euros, indica o estudo do Banco de Portugal assinado por Sónia Félix, Fernando Martins, Domingos Seward e Marta Silva.

Os autores do estudo referem “a queda do salário real dos trabalhadores com ensino superior e secundário, num contexto de aumento significativo da entrada de jovens no mercado de trabalho com estes níveis de ensino”.
“A média do salário real dos trabalhadores com ensino secundário reduziu-se de 1092 euros, em 2006, para 1047 euros, em 2020” e em 2006, “o salário real médio dos trabalhadores com ensino superior era de 1745 euros, 134 euros acima do observado em 2020”, observam.
“Neste período, é de assinalar a entrada de muitos jovens no mercado de trabalho com ensino secundário. Relativamente ao total de entradas, a percentagem de jovens com ensino secundário que entraram no mercado de trabalho passou de 30%, em 2006, para 40%, em 2020, o que justifica em parte a redução das entradas de jovens com ensino básico ou inferior, que passou de 41% para 27%”.
Além disso, “a entrada de jovens com ensino superior no mercado de trabalho apresentou um perfil estável ao longo do período”, acrescentam os autores do BdP.