Notas mais altas no ensino privado do que do público, indica relatório. Quase 40 escolas inspecionadas por inflação de notas

Foto de luminastock | Depositphotos.com

Mais de um terço dos alunos de 39 colégios tiveram 19 ou 20 valores a pelo menos uma disciplina no ano passado, um cenário que se repetiu sempre em 24 desses nos últimos cinco anos, mas em nenhuma escola pública.

As conclusões são de um relatório divulgado esta terça feira  pela Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC), que analisa as classificações internas dos alunos nos cursos científico-humanísticos entre 2017/2018 e 2021/2022.

Numa análise às escolas em que os alunos tiveram classificações internas muito elevadas, os dados mostram que esta tendência é observada, sobretudo, nas escolas privadas.

No ano letivo passado, 84 das 101 escolas privadas com ensino secundário atribuíram classificações médias internas de entre 19 e 20 valores a, pelo menos, uma disciplina, sendo que essas notas foram atribuídas a mais de um terço dos alunos de 39 colégios.

Nas 39 escolas, 46% dos alunos superaram os 19 valores a, pelo menos, uma disciplina, sendo que 38% conseguiram o mesmo feito a todas as disciplinas.

Admitindo que se possa tratar de um resultado pontual, a DGEEC olhou também para o número de escolas em que essa tendência se registou mais do que uma vez nos últimos cinco anos.

No total, são 41 escolas particulares em que a percentagem de alunos com notas internas altas superou os 30%, pelo menos, uma vez desde 2017/2018, sendo que na maioria esse cenário repetiu-se sempre.

Há ainda oito escolas que o relatório identifica com repetições em quatro anos letivos, cinco escolas com três repetições e quatro escolas em que o cenário se registou apenas duas vezes.

Comparando os dados com o setor público, só houve 224 escolas em que algum aluno tenha conseguido obter notas tão altas em, pelo menos, uma disciplina, mas o número cai significativamente quando se procuram esses resultados em mais de 30% dos alunos.

De acordo com os dados divulgados, há apenas quatro escolas públicas em que a percentagem de alunos com notas internas altas superou os 30%, pelo menos, uma vez desde 2017/2018.

Sem nomear os estabelecimentos de ensino, o relatório refere que em nenhuma delas o cenário se repetiu sempre, repetindo-se quatro vezes em apenas um. Noutra, o padrão registou-se duas vezes e nas restantes em dois anos letivos.

“Se alargarmos a análise a todas as disciplinas, verifica-se que, nestas escolas, a proporção de alunos que apresenta uma classificação interna média global entre 19-20 valores a todas as disciplinas foi, em média ao longo dos cinco anos, de cerca de 21%”, lê-se no documento.

O relatório revela, por outro lado, que é mais frequente as escolas atribuírem notas altas nas disciplinas anuais, a maioria não sujeitas a exame nacional.

No ensino público, identificam-se 10 disciplinas em que a moda registada foi de 20 valores, quatro delas de forma continuada desde 2017/2018, todas anuais (Aplicações Informáticas B, Física, Geologia e Química).

No ensino privado, a lista é mais longa, contabilizando-se 19 disciplinas, 12 das quais registaram sempre, ao longo dos cinco anos, uma moda de 20 valores. Dessas, apenas duas são bienais (Geometria Descritiva A e Inglês).

Durante a sessão em que foram apresentados os resultados, que decorreu esta terça-feira no Teatro Thalia, em Lisboa, o ministro da Educação, João Costa, sublinhou a discrepância entre as escolas públicas e privadas.

“Num universo de mais 400 escolas públicas, aparecem quatro” com problemas na atribuição das notas e “no universo de escolas privadas, que é quatro vezes menor, o número de escolas com comportamentos desviantes é dez vezes maior”, lamentou o ministro.

Quase 40 escolas inspecionadas por inflação de notas. Sete devem “repor legalidade”

A Inspeção-Geral da Educação e Ciência (IGEC) inspecionou este ano 39 escolas onde as notas dos alunos pareciam ser excessivamente elevadas, tendo recomendado a sete estabelecimentos de ensino a “reposição imediata da legalidade” das classificações atribuídas.

O inspetor-geral da Educação e Ciência (DGEC), Luís Capela, revelou esta terça-feira que a operação foi realizada entre os meses de fevereiro e março em 37 estabelecimentos cooperativos e privados e em duas escolas públicas.

“Em sete (escolas) tivemos de recomendar a reposição imediata da legalidade porque havia critérios que não estavam bem delineados”, explicou Luís Capela, durante um evento em Lisboa, em que foi divulgado o estudo da DGEEC que alertou para uma eventual inflação de notas em muitas escolas tendo em conta as classificações internas atribuídas entre 2017/2018 e 2021/2022.

A análise das classificações internas dos alunos ao longo de vários anos e a relação desses resultados com as notas obtidas nos exames nacionais tem permitido identificar estabelecimentos de ensino onde existe uma prática reiterada de inflação das notas.

Desde 2019, a inspeção realizada pelas equipas do IGEC já deu origem a cerca de 85 processos disciplinares com sanções aplicadas.

“É importante que os dados se transformem em informação e a informação em ação”, defendeu por seu turno o ministro da Educação João Costa.

“Num universo de mais 400 escolas públicas, aparecem quatro” com problemas na atribuição das notas e “no universo de escolas privadas, que é quatro vezes menor, o número de escolas com comportamentos desviantes é dez vezes maior”, lamentou o ministro.

Numa das escolas em causa, “bem vistos os critérios”, a escala de avaliação da “escala era de 0 a 22 e não de zero a 20”, acrescentou o ministro, anunciando que está a ser revisto o “regime sancionatório das escolas privadas”. Uma das falhas do atual regime é o facto de a inflação de notas ainda não estar tipificada como crime e por isso não existir um quadro sancionatório.

A plataforma do Infoescolas tem desde esta terça-feira novos dados relativos aos mais de 1,17 milhões de alunos matriculados nas mais de cinco mil escolas, contou o diretor-geral da DGEEC, Nuno Neto Rodrigues.

Nuno Neto Rodrigues apresentou as dez principais novidades do Infoescolas, que vão desde dados da evolução dos alunos por nacionalidade ao indicador de equidade passar a estar num gráfico autónomo.

Além do Infoescolas, a plataforma tem também o “Infocursos”, sobre cursos do ensino superior que, segundo Nuno Neto Rodrigues, será atualizado nas próximas semanas.