Um célebre escritor e filósofo franco-argelino do século XX, Albert Camus, assinalou, num conjunto de três pequenas sentenças, o que para ele significava a amizade: “não ande diante de mim, talvez não lhe siga; não ande detrás de mim, talvez não lhe saiba dirigir. Simplesmente ande a meu lado, e seja meu amigo”. Camus procurava que a relação estabelecida com os seus amigos fosse dotada de um equilíbrio saudável, numa articulação entre os passos dados pelo outro e os do próprio. Todavia, não podem estas belíssimas expressões ser extrapoladas para outros contextos mais concretos?
Hoje assistimos ao inaugurar de um novo ano letivo em contexto universitário (e também nas escolas). Se alguns estudantes se encontram nestes dias a entregar os seus últimos trabalhos ou a realizar os seus exames finais, recorrendo a épocas especiais para o efeito – culpa dos constrangimentos provocados pelo surgimento da pandemia da Covid-19 –, outros já se mentalizam em relação ao dealbar das suas aulas, depois de um longo, confuso, inesperável e desmotivador 2.º semestre do ano letivo de 2019/2020. Ainda assim, se todos estes jovens – classe etária e social onde eu mesmo me encontro representado – pretendem gozar o pouco tempo de lazer restante, não deixam, porém, de pairar diversas dúvidas acerca do futuro nas suas cabeças. Não propriamente (embora também) um futuro mais abstrato, fonte de preocupações económicas, políticas ou epidemiológicas, mas um futuro mais específico, ligado à atividade educativa: como vai ser o próximo ano letivo em termos de implementação, organização e gestão do ensino?
As incertezas encontram-se claramente em estado de profusão, principalmente porque falamos de uma categoria de pessoas que, tendo sido sempre obrigada a adquirir uma forte e precoce maturidade perante os acontecimentos e as adversidades, atualmente tem de elevar essa maturidade ao infinito. Aos estudantes, são-lhes requeridas constantemente competências académicas, inovadoras, relacionais, mas agora chegam novos pedidos, os de possuir capacidades de compreensão do outro nas suas dificuldades deste presente. No entanto, essas habilidades têm de se estender a quem governa – especificamente, a quem governa a Educação e o Ensino Superior em Portugal.
Para haver uma possível benéfica aproximação de um equilíbrio entre as emoções sobre o estudo e o ter materiais para o realizar, torna-se necessário que o cenário de ensino à distância a 100% não se instale novamente. É, muito antes disso, urgente um planeamento conciliável entre uma parte de aulas presenciais e outra parte de aulas pela Internet. Deste modo, conseguirá recuperar-se as principais vantagens do ambiente educativo físico – maior aproximação afetuosa entre colegas e entre discentes e docentes, maior facilidade de esclarecimento de dúvidas na hora, maiores virtualidades no trabalho de campo, entre outras – e explorar-se-á o potencial da formação digital, com materiais e metodologias adequadas ao efeito. Como diriam Stephen Stoer e António Magalhães no seu livro publicado em 2005, A Diferença Somos Nós: A Gestão da Mudança Social e as Políticas Educativas e Sociais, nenhuma educação nem nenhumas políticas educativas podem ficar reféns quer de uma performance extremada (estritamente baseada nas competências para o mundo laboral capitalista) quer de uma pedagogia radical (restrita à escolarização sem aptidões profissionais).
Se pretendemos efetivamente preparar os jovens de hoje para o futuro, seja ele qual for, temos de ser um “amigo de Camus”: procurar caminhar lado a lado de um Ensino Superior atualizado, isto é, digital, inovador e mais igualitário.
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Este texto faz parte de uma série de textos de opinião de alunos do ensino secundário e superior sobre a sua visão do ensino e da educação.
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