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Should I stay or should I go?


Muitos identificam o título com a icónica música dos The Clash. Mas este é, também, um dilema que muitos estudantes enfrentam ao frequentar um curso superior, e eu não fui exceção.

Demorei algum tempo a ganhar coragem para escrever este artigo, pois tinha muito medo de ser julgada. Mas penso que o facto de poder vir a ajudar estudantes numa situação semelhante supera quaisquer críticas que possa vir a receber pela decisão que tomei: sair de medicina.

Dia 26 de setembro de 2021 recebi o e-mail da DGES a confirmar a minha colocação em medicina, na Universidade de Lisboa. Fiquei imediatamente em êxtase. Eu tinha conseguido!! Todo o trabalho que tivera até então tinha dado frutos, e aguardava-me um futuro brilhante. Um futuro com altos e baixos, certamente, mas que me traria a felicidade que sempre ambicionara, pensava eu. 

No entanto, são raras as vezes em que a vida corre como planeámos, e este é apenas mais um exemplo disso. Poucos dias após ter começado as aulas em medicina, apercebi-me que estava no sítio errado. O ambiente da faculdade era incrível, o espírito de entre-ajuda excecional e os professores e monitores extremamente acessíveis. Todavia, as matérias que estudávamos pouco me interessavam, e algo dentro de mim me fazia sentir deslocada, como se não pertencesse ali.  É um facto que é típico os alunos sentirem um impacto ao entrar na universidade – que se deve sobretudo ao aumento da dificuldade e quantidade de matéria, para além da transição de um ambiente familiar e conhecido para um onde são apenas uma árvore numa floresta -, pelo que no início a adaptação pode ser difícil para qualquer um. Apesar disso, e por mais que tivessem saudades de casa ou se sentissem intimidados com a quantidade assoberbante de matéria, eu via os meus colegas fascinados, entusiasmadíssimos com tudo o que os rodeava e com um brilho nos olhos cada vez que aprendíamos alguma coisa. Mas eu [que não era estudante deslocada] não me sentia nada assim, antes pelo contrário. Sentia-me mal comigo própria. Sentia que não era eu mesma, sentia-me angustiada, sentia-me infeliz. 

Rapidamente percebi que não podia continuar assim, pelo que comecei a procurar alternativas, nomeadamente candidatar-me a outro curso na terceira fase. A escolha que me pareceu mais óbvia foi matemática, que tinha sido aliás a minha outra opção de candidatura, caso não entrasse em medicina. Desde que me lembro que foi a minha disciplina preferida na escola. Porém, tinha um certo receio de, por um lado, fazer a escolha errada – e se também não fosse gostar de matemática? – e, por outro, do que os outros iriam pensar: desistir de medicina depois de ter trabalhado tanto? Um curso tão procurado e de tão difícil acesso?…Depois de refletir bastante sobre o assunto, e de ter falado com os meus amigos e familiares mais próximos, percebi que o mais importante era o meu bem-estar, e que se não estava feliz então a escolha certa era mudar. Aliás, como me foi dito por alguém bastante sábio, “grande parte das vezes, a escolha certa é a que mais nos assusta”. E eu estava assustada. Seria boa ideia trocar algo seguro e garantido por um curso que podia correr mal?… A verdade resumiu-se ao seguinte: era garantido que iria gostar de matemática? Não. Mas era garantido que onde eu estava não poderia continuar. 

E assim fiz. Candidatei-me a matemática na Universidade Nova de Lisboa na terceira fase de candidaturas, e entrei. Estou cá há apenas 3 meses, mas posso dizer com segurança que não me arrependo minimamente da escolha que fiz. Estou a adorar não só o curso mas também o excelente ambiente da Universidade e, em particular, de matemática. Tinha saudades disto. Saudades do quão satisfatório é conseguir resolver um exercício que deu luta. Saudades de pegar num problema, analisá-lo, estruturá-lo e formular uma resolução. Saudades de usar o raciocínio lógico e de pensar sobre problemas e desafios complicados, no geral. Agora sim, sinto-me como peixe na água. Sinto que sou eu própria. Sinto-me feliz. Se há algum arrependimento que possa sentir, é não ter escolhido matemática logo de início.

Não pretendo, com este texto, desencorajar alguém de seguir medicina ou assustar futuros universitários. Escrevo, sim, com o intuito de, por um lado, partilhar que as coisas nem sempre correm como gostaríamos, e não há problema nenhum. É completamente normal, muito mais do que imaginamos – estudos mostram que milhares de alunos mudam de curso todos os anos. Por outro lado, há que ter coragem. Coragem para arriscar. Coragem para sair da zona de conforto – ou, neste caso, de desconforto. Coragem para abraçar o desconhecido sem saber o que nos espera. Porque afinal de contas, quem somos nós se não fizermos tudo o que está ao nosso alcance para que possamos ser felizes? Não quero com isto dizer que a escolha certa é mudar, atenção. Em última análise, e respondendo à questão inicial: should I stay or should I go? Deixo isto ao critério de cada um. Para mim, sair foi a decisão certa. Ou pelo menos é esta a forma como vejo as coisas, de momento. Mas a vida dá muitas voltas, e quem sabe – se calhar teria sido igualmente feliz, tivesse esta escolha tomado outro rumo. Por isso, é importante reconhecermos que podemos falhar – ou tomar aquela que mais tarde nos pode vir a parecer ter sido a “escolha errada” -, mas não devemos ter medo de o fazer. O que importa é que não nos inibamos de tomar a decisão que nos parece mais acertada, no presente. E o futuro? Disso a vida encarregar-se-á.

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Este texto faz parte de uma série de textos de opinião de alunos do ensino secundário e superior sobre a sua visão do ensino e da educação.

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