É um dia cinzento, não porque está de chuva visto que não está, mas sim porque não era suposto eu estar em casa neste dia.
Numa realidade normal ter-me-ia levantado com uma estranha vontade de vestir o traje académico e calçar aqueles sapatos um quanto tanto desconfortáveis. Teria, provavelmente, esfarrapado mais umas meias, porque ao fim de três anos ainda não as consigo usar sem o fazer. Sonolenta, ficaria a pensar a que botão da camisa se prendia o quico (o chapéu do traje feminino leiriense) e para que lado era o laço do mesmo. Finalmente trajada, iria para a faculdade e observaria uma imensidão de capas negras, prontas para celebrar comigo aquele que seria o dia que marcava o findar deste nosso percurso. Os estudantes esboçariam um sorriso transcendente nas suas faces e as famílias um olhar emocionado e um orgulho desmedido, por verem os seus filhos, irmãos, netos ou primos pisarem o palco da última despedida.
A minha faculdade, no coração do Lis, é dos poucos locais ou mesmo dos únicos, onde a bênção de finalistas é realizada num evento completamente divergente à semana académica. Para além disso, na minha escola, não há bengalas nem cartolas, apenas uma passadeira de capas negras por onde os estudantes desfilam ao som de aplausos dos familiares e amigos. Era hoje que eu iria passar por esse cordão de capas estendidas e gritar numa só voz o hino do pior, melhor e único curso, erguendo a minha pasta.
Porém, a realidade atual é outra. A pasta ficou na costureira à espera de ser tingida com o dia de finalista, porque não houve tempo para isso. As fitas ficaram vazias à espera de chegarem àqueles que as iriam escrever, porque não houve tempo para isso. Os amigos ficaram em casa à espera de saberem qual seria o restaurante onde se iria jantar e festejar o final deste dia e a família ficou em casa à espera de poder dar aquele abraço aconchegante de orgulho e aquele ternurento beijo de satisfação, que agora, já não pode ser concedido. E eu fiquei aqui, nesta varanda de metro quadrado a celebrar o meu dia de finalista … sem a pasta, sem o cordão de capas negras, sem os aplausos dos amigos e os abraços da família, sem as fitas preenchidas com amor, carinho e histórias intermináveis.
O fim foi adiado e o futuro é incerto. Contudo, de uma coisa eu tenho a certeza: sou uma estudante quase licenciada, mestre em rasgar a saia do traje e feliz por ter vivido estes três anos na cidade que me viu crescer, ter descoberto os “Segredos de Leiria” junto dos amigos que a universidade me quis conceder e ter criado uma caixinha de memórias, marcadas agora num coração padecido de uma eterna saudade.
A todos os que neste mês de maio celebram o findar do seu percurso académico, os meus parabéns por todas as conquistas alcançadas e não se esqueçam: o final não era o programado, mas não o deixem de viver, com a esperança de que um dia o possamos celebrar como sempre sonhámos!
Vestimos de preto, hoje em nossas casas e sempre nos nossos corações.
E como cantam as tunas leirienses: “foi assim que o mundo mudou para um estudante que sempre te amou” “linda leiria” “faz-nos crescer” “com coragem, vamos vencer”. Vamos vencer. Em Portugal e no Mundo.
Este artigo foi escrito a 16 de Maio, dia em que seria a celebração descrita.
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Este texto faz parte de uma série de textos de opinião de alunos do ensino secundário e superior sobre a sua visão do ensino e da educação.
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