Vestir de Negro: Primeiro Passo

Traje. Esta coisa que é tão complicada. Chega agora a altura do ano em que é preciso comprar traje. Traje para aqueles que há uns meses iniciaram a sua vida académica. Sejam os mais novos nestas andanças a pedir, ou nós, os que em breve partiremos, a chatear-lhes a cabeça, e a dizer-lhes que têm de começar a pensar no assunto.

Seja qual for a tua situação, o teu lado, nem um, nem outro é fácil. Se és caloiro, sentes, neste momento, uma enorme felicidade, em vestires o traje pela primeira vez. Este momento vai fazer-te sonhar alto e pensar no futuro, como serão as coisas quando fores veterano, quando puderes praxar e fazer parte daqueles que vestem de negro. Aquele grupo que te acolheu, há uns meses, e acolherá sempre que necessitares. Vais querer sair da loja logo com ele vestido. Mas ainda é cedo. Acredita que é cedo. Eu dava tudo por poder ir agora comprar o traje pela primeira vez. Por ter aquele bichinho na barriga, de novo.



Mas o meu lado agora é outro. É o de quem fica à espera do lado de fora do provador, à espera que te mudes, à espera que te trajes, que vistas uma saia ou um par de calças, que venhas cá para fora, para te poder dar a gravata, um colete, um casaco, ou uma batina. Estou deste lado, o de quem espera eternamente para que este momento demore muito tempo a chegar.

Não é que não te queira ver assim, por que quero, mas é cedo. É e será sempre cedo. Cedo demais para seres veterano/a, é cedo demais para eu te ver dessa forma. Para ti caloiro/a, que (achas que) estás mais que preparado/a, estás mais que pronto para vestires esse traje, para começares a dizer que te doem os pés, ou que tens muito calor dentro do provador e ainda falta vestires um casaco ou uma batina e pores uma capa aos ombros, sem que te apercebas bem do calor que vais passar. Ao leres isto e ao pensares nisto, imagina bem o que nós passámos, passamos e passaremos, naquelas tardes de setembro, com 30ºC à sombra se for preciso, mas estávamos lá para ti. Estás a sentir uma amostra desse calor, calor que nos une, sem darmos conta. Mas que assim é, porque isto é, o inicio de uma longa caminhada. É o primeiro passo de uma grande caminhada e tu estás, ou achas que estás, mais que pronto/a para começares a tua transição, de caloiro para veterano. Embora ainda estejas só no primeiro passo desta caminhada que vai ser tão importante para ti.

Mas eu, nunca te deixarei de ver como caloiro que és e sempre serás. Por mais que te queira ver ser um veterano brilhante, vou sempre ver-te como um caloiro burro que és.

Por muito boa madrinha que seja, e por muito bom afilhado/a que tu sejas, por muito bom caloiro/a que tu sejas e por muito bom veterano/a que possas vir a ser, digo-te hoje, depois de te ver sair de um provador, que para mim vais ser sempre caloiro/a. Olhar para ti como veterano/a vai ser muito difícil. Mais uma vez, não porque não tenha o maior orgulho em ti, mas sim porque para mim serás sempre o meu caloiro/a, meu afilhado/a, serás sempre a pessoa que eu vou aconselhar, ensinar, perdoar (mesmo quando não há perdão), ralhar e chatear a cabeça porque fizeste asneira. Serás sempre uma pessoa, que eu vou proteger, trajada ou não, eu vou sempre cumprir a minha palavra, vou estar sempre lá para ti, desde o momento em que te disse que “Sim”, vou sempre proteger-te. E a verdade, é que um veterano/a não precisa de proteção, por isso para mim serás sempre caloiro/a.

Ainda tens muita coisa para aprender, mas isso fica para depois. Por agora estás pronto/a. Pronto para começares a tua transição. Estás preparado/a para honrares o teu curso e a tua faculdade, e para os representares da melhor forma que consegues, através do traje. Por isso não tenhas medo, não tenhas medo de ir comprar o traje, se ainda não o fizeste, não tenhas medo de o experimentar, mas lembra-te sempre que tens muito para aprender, muito para viver, e que em qualquer momento podes sempre pedir ajuda a quem sempre te ajudou e deu apoio. Aos teus padrinhos. Pois, os padrinhos podem sair da faculdade, mas não saem da nossa vida. E digo nossa, porque eu já passei por isso. Eu sei o que é vê-los partir da faculdade.

Depois disto tudo, agora que olho para trás e penso duas vezes sobre o assunto sei que não eras tu que não estavas preparado/a para ir comprar traje, mas sim eu, que não estava, e provavelmente nunca estarei preparada para te aceitar do mesmo lado que eu, para te ver trajado/a, um dia… mais tarde ou mais cedo aceitarei isso, mas preparada nunca estarei, tal como não estava em Setembro quando entraste na minha vida, mas se fiz um bom trabalho até agora, sei que depois também farei, mas a cima de tudo, sei que te dei tudo para seres melhor veterano/a do que eu alguma vez fui, e sei que me vais deixar mais orgulhosa do que o que estou agora. Depois disto tudo, sou eu que não estou preparada para ser finalista, dentro de poucos meses, que vão parecer semanas, sou eu que não estou preparada para te deixar, porque no final de contas, sei que melhor trabalho contigo não podia ter feito.

Por isso, a todos os caloiros/as que vivem este momento agora, e que estão ansiosos para comprar traje e para começar a sua transição, força, peçam aos vossos padrinhos que vos levem, que vos acompanhem, neste momento importante da vossa vida académica, pois apesar de ser difícil para nós, não há nada que nos deixe mais orgulhosos do que vos ver crescer felizes, tal como uma mãe e um pai vêm um filho crescer e depois partir. Àqueles que como eu estão deste lado, de os ver começar a partir, não se preocupem, se fizeram um bom trabalho, eles vão sempre voltar ao ninho, porque no fim de contas, a capa do padrinho e da madrinha será sempre o melhor sítio do mundo para se estar.

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Este texto faz parte de uma série de textos de opinião de alunos do ensino secundário e superior sobre a sua visão do ensino e da educação.

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