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A Saúde Mental no Ensino Superior


A entrada no ensino superior exige do/a jovem universitário/a uma adaptação que ultrapassa o simples ambientar às novas dinâmicas académicas. Considerando que cada estudante é único/a e traz consigo uma bagagem heterogénea, os desafios inerentes a este processo de adaptação serão também eles distintos. Pensemos nos/as estudantes deslocados/as, nos/as trabalhadores/as estudantes, nos/as estudantes que coabitam com uma família desestruturada e/ou violenta, em estudantes com dificuldades económicas e/ou em estudantes com patologia mental prévia. Pensemos também na vivência da crise pandémica como um período potencialmente agravante das dificuldades já existentes, empurrando o/a jovem estudante para o ensino à distância e para a privação do contacto social. Que respostas, então, os palcos do ensino superior poderão oferecer ao jovem adulto ainda em construção do seu sentido de identidade?

Dados da Direção Geral de Saúde (2017) revelam que Portugal é um dos países europeus que apresenta maior prevalência de doença mental, salientando-se as perturbações depressivas e de ansiedade. Ademais, dados do Inquérito sobre o Estigma em Saúde Mental (2019) revelaram que cerca de 42.7% dos/as estudantes do ensino superior em Portugal já tinham experienciado, a dado momento da sua vida, um quadro clínico significativo. Porém, no que diz respeito ao apoio psicológico, 80% dos/as estudantes consideram que as suas faculdades não asseguram este apoio (dados do inquérito conduzido em 2021 pela Associação de Estudantes da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas). Para tornar a situação ainda mais complexa, falemos da variável estigma relacionada com a saúde mental.

Os sistemas de crenças relacionados com a saúde mental constroem barreiras invisíveis na sociedade, potenciando o preconceito e a discriminação. Pelo facto de diversas patologias do foro mental não revelarem, à primeira vista, sinais tão percetíveis como a doença física, são frequentemente desvalorizadas, culpabilizando-se ainda a pessoa pelo seu estado de saúde mental. Passar a mensagem que desafios emocionais são expectáveis a determinado momento do nosso percurso de vida parece ser ainda uma missão de logo prazo. De facto, a velha máxima “só vai ao psicólogo quem é maluco” representa um lema tão arcaico que, atrevo-me a dizer, ser classificado/a de “maluco/a” já passou a ser um elogio; mas para que esta ideia não provoque tanta estranheza, convido a apoiar-nos em Fernando Pessoa:

A loucura, longe de ser uma anomalia, é a condição normal humana.
Não ter consciência dela, e ela não ser grande, é ser homem normal.
Não ter consciência dela e ela ser grande, é ser louco.
Ter consciência dela e ela ser pequena é ser desiludido.
Ter consciência dela e ela ser grande é ser génio.”

Fernando Pessoa

Reforçar os serviços de apoio psicológico à comunidade académica revela-se imperativo – pela saúde dos/as jovens estudantes e pela possibilidade de reduzir os números de abandono académico no primeiro ano de curso. Não será sensato esperar dos/as nossos/as estudantes universitários/as que devolvam posteriormente à sociedade, já em transição para o mercado de trabalho, as suas aprendizagens se se encontraram (ou ainda se encontram) em sofrimento psíquico; sobretudo se as competências socioemocionais são atualmente as mais procuradas no mercado de trabalho.

 

A prevenção é, ainda, a palavra-chave na elaboração de estratégias de intervenção. Como tal, é fundamental apostar na literacia em saúde, particularmente na saúde mental, como agregadora do bem-estar da comunidade académica. A literacia para a saúde poderá ser definida como a capacidade individual que cada pessoa tem para aceder, comunicar, compreender, refletir e tomar decisões face à sua saúde. O acesso a informações relevantes e sólidas influencia diretamente as atitudes dos indivíduos, potenciando a confiança no acesso aos serviços de saúde e capacidade para estarem atentos aos primeiros sinais de sofrimento emocional.

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Este texto faz parte de uma série de textos de opinião de alunos do ensino secundário e superior sobre a sua visão do ensino e da educação.

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