É muito provável que este texto acabe por ser uma forma de desabafo. Também é importante dizer que serei profundamente subjetiva. Daqui a uma hora irei dar a abertura oficial ao estudo intensivo para os exames finais (que se prolongará possivelmente até julho) e ainda não sei exatamente o que vou fazer ou como me vou organizar. Há uns dias fez-se entoar pela milésima vez aquela frase super incomodativa que, em situações normais não me afetaria, mas que em vésperas de estudo, com o nervosismo e preocupação a ocuparem a minha mente, me fez ficar indignada. Faço referência à frase “Se te queixas agora que és estudante, imagina quando trabalhares.”; que por vezes também é proferida da seguinte forma: “Achas a vida de estudante difícil?”.
Quando ouço este tipo de comentários, juro que se gera em mim uma sensação de descontentamento enorme, porque quem diz algo do género não estará de todo a pensar corretamente ou a sua experiência vivencial não lhe permitiu poder tirar ilações acerca daquilo que é ser estudante universitário. Eu frequento um Mestrado Integrado, o que significa que, estando no fim do primeiro ano, me faltam pelo menos quatro anos para terminar. Não vale a pena entrar por questões mais filosóficas sobre a complexidade associada ao meu curso em concreto, por ser integrante da área científica, porque acredito que todos os cursos têm os seus desafios e dificuldades. Felizmente para mim, o meu curso ainda vai tendo uma taxa de empregabilidade aceitável, muito aquém daquilo que já foi, é certo, mas que comparativamente a outros cursos ainda se destaca. A vida de estudante é dispendiosa e incerta.
É na incerteza que a nossa preocupação reside durante todos os anos em que somos estudantes. Faz parte do senso comum que ir para a universidade, nos dias de hoje, estará longe de significar uma empregabilidade certa. Investimos porque acreditamos e verdade seja dita, haverá sempre mais oportunidades para quem segura um diploma deste género. Tive a oportunidade de ler há pouco tempo um texto também em forma de desabafo de uma pessoa que estudava psicologia e do drama que ela vivia por toda a gente lhe dizer que o desemprego seria o destino final. Como é suposto alguém se sentir motivado quando ouve algo deste género?
Vir para a universidade foi uma escolha minha. Conheço pessoas que se deixaram ficar por cursos profissionais e não me sinto mais que elas. Por vezes até as invejo. Não me interpretem mal porque eu sei que a oportunidade que estou a ter é algo que nem toda a gente tem. Não tenho qualquer ansiedade pela independência económica, acreditem. E claro que acredito, até nos momentos mais desmotivadores, que no fim serei recompensada caso contrário não continuaria a estudar. Mas dá que pensar quando vejo alguns amigos a começar a construir uma vida, a gerir o dinheiro deles e eu com 20 anos, com perspetivas de terminar o curso aos 24 e sem saber ao certo o que o destino me reserva. Desengane-se quem pensa que estando na área de estudo é sinónimo de felicidade. Dentro do meu curso existem áreas que sinceramente, não me são muito apelativas.
Mas regressando ao ponto essencial. Acreditam que os estudantes têm a sua vida facilitada? Estou quase no fim do meu primeiro ano e sinto que nunca tive um ano que se comparasse a este ao nível de exigência emocional e física. Sinto-me cansada. Não tenho memória de dormir tão pouco e de me sentir tantas vezes desmotivada. Não devemos confundir trabalho com independência económica. Tenho noção de que muitas vezes o trabalhar é associado a começar a pagar contas e a jogar ao jogo do “Como vamos gerir este dinheiro de forma a que dê para tudo”. Trabalhar, assim como estudar, devem ser vistos como os papéis que desempenhamos na sociedade. Quem diz que um trabalhador tem mais dramas do que um estudante? Analisemos a situação: existem pessoas que trabalham em ambientes péssimos, muitas horas e com uma remuneração que chega a fazer rir. Nós, estudantes, também temos que lidar diariamente com todo o tipo de ambiente: existem bons profissionais que se preocupam e outros que nem sei explicar como chegam a professores universitários; também dedicamos muitas horas ao estudo, que vão muito além do horário diurno. E muitas vezes a forma como são organizados os horários e métodos de avaliação também nos oferecem resultados que chegam a fazer rir. Ao fim do dia encontramo-nos todos no sentimento de descontentamento e de nenhuma retribuição pelos esforços que fazemos.
Um estudante universitário em Portugal, numa universidade pública tem um valor de propinas que ronda os 1000€ por ano. Repito que o meu curso tem cinco anos. Sim, é um verdadeiro investimento. Mas o pior é que pago 1000€ por ano em propinas e não posso beneficiar de tudo aquilo a que tenho direito por estudar nesta universidade. A vida de estudante é uma vida de escolhas. Um dos assuntos mais polémicos que se vive atualmente na minha faculdade é a questão da calendarização das avaliações quer de frequências, quer dos exames finais. Somos literalmente forçados a escolher cadeiras para fazer em época normal e deixar outras para recurso porque se torna humanamente impossível conseguirmos ter sucesso a fazer cinco frequências em uma semana. Porque alguém decidiu acordar um dia e pensar que colocar os alunos a fazer exames todos os dias seria algo incrível de ser testado. Mas nós somos ratos de laboratório? E ainda nos obrigam a fazer as frequências ao sábado porque se andamos na universidade devemos vivê-la intensamente: de dia, de noite e ao fim de semana. “Começasses a estudar mais cedo” – diz alguém. Mas e os trabalhos que somos obrigados a entregar durante o semestre? E as aulas laboratoriais que temos que preparar? Sabe deus como às vezes temos as fotocópias e resumos em dia, quanto mais o estudo.
E os alunos? Ninguém me obriga a fazer estas escolhas, é certo, mas são fruto da mesquinhez de alguém que não é realista. Porque, na realidade, qualquer pessoa, com habilitações ou não, percebe que aquilo que nos exigem é um absurdo. Mas vai começando a ser regra, nas universidades, que o que menos importe sejam os alunos. Porque se dizem que é fácil e eu não estou a conseguir, ou estou a matar-me para conseguir como me devo sentir motivada? Escolher: ou hei de estudar, ou hei de ir às laboratoriais, ou às teóricas ou talvez um dia deixe definitivamente de dormir. Já faltou mais.
Acredito que nada sei sobre o mundo do trabalho, que não sei o que custa viver e ser independente, mas posso falar por aquilo que vivencio e a vida de estudante não é uma vida de facilitismos. É uma vida de incertezas e de escolhas. Por isso, por favor, que nunca mais ninguém repita perto de um estudante que a vida dele é fácil.
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Este texto faz parte de uma série de textos de opinião de alunos do ensino secundário e superior sobre a sua visão do ensino e da educação.
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