Ao próximo Governo de Portugal: deem-nos a oportunidade de ensinar

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Desde há vários anos que tenho “sonhado” com a profissão de professor. A minha parte favorita da conexão humana é a possibilidade e a reciprocidade da partilha de conhecimentos e experiências. Por isso, a minha realização profissional passa por ter um emprego cujo aspeto central seja esta troca de vivências que permite a todos/as os/as envolvidos/as aprenderem e construírem (um melhor) sentido ao longo das suas ações.

Um dos ofícios que se encaixa perfeitamente com o que referi no parágrafo anterior é, sem dúvida alguma, a docência. Imagino-me numa sala a trabalhar conteúdos, pensamentos críticos e resultados com jovens que possuem diferentes histórias de vida e desejos diversos. Formar, qualificar, educar as futuras gerações é um trabalho nobre, que, feito com esforço, rigor, elegância e amizade, dignifica quem o coloca em prática. Contudo, infelizmente a carreira docente, nos tempos que correm e em Portugal, não sente a compensação por essa nobreza, para além de se encontrar com enormes dificuldades ao nível da sua revitalização. Um artigo do dia 3 de fevereiro deste ano, publicado pela Uniarea, informa, entre outros dados, que a percentagem de estudantes diplomados/as em cursos ligados à área da Educação sofreu uma queda e que mais de metade dos/as professores tem uma idade superior a 50 anos. A partir disto o Conselho Nacional de Educação (CNE) alerta que, se esta tendência se mantiver, haverá uma perda de quase 20.000 docentes até antes do final da presente década e dificuldades acrescidas na contratação de novos/as professores/as habilitados/as a lecionar nos ensinos pré-escolar, básico e secundário. Já num artigo um pouco mais antigo, de 18 de novembro de 2021, agora no Público, escreve-se que o “Governo quer formar diplomados de outras áreas para colmatar falta de professores”. A ideia é a de “atrair diplomados de áreas que não a do ensino para serem formados dentro das próprias escolas e terem assim acesso à carreira docente”, sendo feita também uma revisão da “lista de cursos que confere habilitação própria para a docência”, a qual já não ocorre desde 2006.

Estas medidas parecem-me bastante interessantes para responder às exigências já mencionadas que emergem dentro do setor educativo. E a minha vontade de que se realizassem é o que justifica o título deste meu texto. Pessoas como eu gostariam de seguir a área do ensino, mas tanto nos ensinos pré-escolar, básico e secundário como no superior os critérios de exigência são muito constritores. No caso do ensino superior, são muito raras as pessoas que conseguem lecionar uma cadeira sequer sem terem o doutoramento, o que obriga a mais anos de estudo e, amiúde, a tendermos para a área da investigação (frequentemente influenciados/as pelos/as orientadores/as e outros professores/as que acompanham a nossa trajetória), a qual nem sempre é desejada pelos/as estudantes. Escrevo por mim, gostaria que pudesse ser docente no ensino superior sem a obrigatoriedade de ser investigador. Então, face a estas condições, inclinamos o nosso olhar para os outros níveis de ensino. Todavia, a requisição de um mestrado em ensino de uma área específica tolhe muitas vezes as chances de alguém seguir a docência – algo que poderia facilmente ser alterado se se tornasse possível que estudantes, licenciados/as (e mestres) em áreas como Matemática, Filosofia, História, Biologia, Sociologia, Geografia, etc. pudessem auferir uma formação concreta que abrisse portas à aliança da sua área de estudos à lecionação.

Daí o meu apelo ao próximo executivo para que tenha em conta os dados apresentados sobre a falta de docentes a curto prazo e o envelhecimento dos/as mesmos/as e atue no sentido de criar a oportunidade aos/às licenciados e aos/às mestres de se qualificarem, na base de critérios concretos definidos, para a lecionação, diversificando o sistema educativo e permitindo que a carreira docente se refresque e se torna vívida a partir de novos conhecimentos que estas pessoas certamente trarão. A educação é um processo imprescindível ao desenvolvimento do ser humano e das sociedades, contribuindo para uma cidadania crítica e atenta às sempre novas complexidades do mundo, que só pode correr bem se nos preocuparmos menos com as burocracias tecnocratas e mais com os benefícios que a produção de conhecimentos e de práticas intergeracionais nos pode trazer.

 

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Este texto faz parte de uma série de textos de opinião de alunos do ensino secundário e superior sobre a sua visão do ensino e da educação.

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