Maioria dos universitários acha normal copiar num exame

A cultura do copianço parece estar instalada e até ser bem aceite entre os estudantes universitários. O maior inquérito alguma vez realizado em Portugal sobre esta matéria, que abrangeu 7292 alunos de 101 faculdades e institutos politécnicos, é revelador: dois em cada três deixam os colegas copiar e 52% admitem fazê-lo eles próprios.

“Há uma cultura de fraude que é permitida no ensino superior em Portugal. O grau de tolerância demonstrado em relação a este fenómeno é muito superior ao que existe noutros países europeus, nomeadamente os nórdicos, e aproxima-se dos valores obtidos na América Latina”, diz ao Expresso Filipe Almeida, coordenador do estudo “A Fraude Académica no Ensino Superior em Portugal”, concluído no ano passado pelo Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra e esta terça-feira lançado em livro.

Apesar de estar muito disseminada, a predisposição para o plágio e para a fraude académica não é igual em todos. Os rapazes têm mais propensão para copiar do que as raparigas e, no geral, os mais cábulas são os estudantes oriundos de meios mais favorecidos, filhos de pais com maiores habilitações académicas e rendimentos mais elevados.

“Uma das explicações tem a ver com a pressão para o sucesso, que é um dos fatores mais apontados pelos estudantes como justificação para a fraude. O filho de um médico ou de um engenheiro, por exemplo, sente-se provavelmente mais pressionado a ter boas notas do que um aluno filho de pais com baixas habilitações, que se calhar é o primeiro da família a chegar à universidade. Acabar o curso, independentemente da média, pode já ser visto como suficiente pelos familiares desse aluno, o que diminui a pressão”, explica o investigador.

 

Além da exigência de conseguir boas médias, os estudantes apontam a carga excessiva de trabalho como desculpa para copiar num exame ou plagiar um trabalho académico na internet.

No estudo, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, foram inquiridos estudantes de 182 cursos diferentes, entre licenciaturas e mestrados. E não saem todos iguais na fotografia: por áreas, os alunos de Engenharias são os menos “fotogénicos”, ou seja os que revelaram maior predisposição para usar cábulas e copiar pelos colegas. Já os de Direito parecem ser os mais “compostinhos”, isto é os que apresentam valores mais baixos de propensão para a fraude.

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Já a predisposição dos estudantes para denunciar colegas que copiam é praticamente inexistente em todas as áreas. Ainda assim, é também entre os alunos de Direito que é mais elevada.

 

Os diferentes tipos de fraude não são alvo do mesmo nível de censura. Comprar um trabalho académico a um colega é a prática que os estudantes consideram mais grave e inaceitável. Já apresentar o mesmo trabalho em várias disciplinas, sem avisar o professor, não é particularmente mal visto.

De acordo com os resultados do inquérito, a criação de uma relação de maior proximidade entre alunos e professores e o aumento da gravidade das penas associadas a estas práticas são apontados pelos estudantes como os fatores que mais poderão contribuir para diminuir o copianço e outras formas de fraude académica.

“Não é que as penas previstas no regulamento da maior parte das instituições sejam leves. Até podem levar à expulsão. A questão é que praticamente nunca são aplicadas”, critica Filipe Almeida.

O coordenador do estudo, que também inquiriu 2727 professores, considera que, nesta matéria, as faculdades e institutos politécnicos também têm muitas culpas no cartório. “As instituições não parecem muito comprometidas com o combate à fraude académica. Os docentes são sobretudo avaliados pela sua atividade como investigadores e não tanto pela sua atividade pedagógica, o que faz com que haja uma certa desvalorização do que se passa na sala de aula”, lamenta.