Em busca do tempo encontrado

Todos os estudantes universitários passam por um processo que se adivinha difícil. O ingresso para o ensino superior é um assunto muito sério, porque vai definir a casa que nos vai formar, portanto, superiormente. Num processo regular de escolha, as universidades privadas acabam sempre por ficar para segundo plano. Para mim, não foi diferente.

Sem qualquer tipo de pudor ou vergonha, posso dizer que falhei redondamente a tudo o que me propus na primeira vez que ingressei no ensino superior, tendo em conta que por poucas décimas acabei por ir para a Direito em pós-laboral, na FDUL. Acabei por desistir antes do final do primeiro semestre por achar que não fui feito para as leis, embora as leis tenham de ser feitas para mim. De lá, tiro algumas boas memórias, nomeadamente as aulas. Até porque era raro comparecer. Mas a cerveja custava 0,50€ e os matraquilhos 0,20€. Para quê comer? Por 0,70€ de cada vez cavava um buraco que ao mesmo tempo ia tapando – e tinha plena noção disso. Eu não queria Direito, e Direito não me queria a mim. Caí numa falácia muito comum que já todos ouvimos na vida, por exemplo, no secundário – é o adiar duma escolha. Adiar significa pôr em standby. E para quê adiar algo inevitável? Tal como ouvimos isto em relação ao curso de Ciências, ouvimos também em relação a Direito. Mas a falta de brio consome qualquer vontade que possamos ter. Para trás deixei alguns bons companheiros, padrinhos e aqueles ‘matrecos’ que tanto fizeram por mim.



O ano 2015/16 revelou-se uma tempestade perfeita para quase todas as pessoas que conheço, nascidas no ano de 1997, porque a amostra que acabei por ter da minha escola secundária foi que muito pouca gente acabou, de facto, onde queria. Ou no curso errado, ou no estabelecimento errado. No meu caso, foi em ambos. Devo confessar que pondero várias vezes se me devo arrepender por ter escolhido mal à primeira, mas não o faço. De todo. Sem uma média brilhante, fui repetir os exames. Mas os primeiros meses foram passados a engordar e a jogar computador. Foi um descanso que permiti a mim mesmo. Mas cada dia se tornava mais cansativo. E porquê? Porque comer batatas fritas e jogar CS:GO não é vida para nenhum rapaz de dezoito anos. Ainda para mais para uma pessoa que se considera particularmente ambiciosa. O que fiz de abril em diante foi preparar os exames e aprender a tocar guitarra. Hoje, considero-me um novato bastante razoável de guitarra. Sabem qual é o problema de ser um preguiçoso com ambições? Torna-se irónico o facto sentires que és a antítese de ti mesmo. Prezo-me pela minha extraordinária capacidade de procrastinação e ‘desenrascanço’ – a mais portuguesa das palavras, eu sei. Mas engraçado é que em pouco mais de um mês consegui masterizar algumas das minhas músicas preferidas na guitarra. E não, não tenho qualquer tipo de talento musical inato. Esforcei-me. E fica difícil não pensar no que posso fazer se me esforçar tanto a nível académico como me dediquei à guitarra naquele curto espaço de tempo. Se dá para um, dá para todos.

 

Com uma incrível paixão pela escrita, eu decidi seguir aquele que sempre foi um sonho: o jornalismo. Ciente dos grandes nomes que a católica formara na área, mas dos custos que a mesma implicaria, candidatei-me à ESCS. Independentemente disto, e por precaução, inscrevi-me na Universidade Católica, sem saber, a priori, qual é melhor é pior. E ora, em abono da verdade, ser melhor ou pior são, no fundo, dois conceitos muito subjetivos. São juízos. E não sou fã dos mesmos.

As aulas começam tradicionalmente mais cedo na Católica e, por isso, lá fui eu. Dez meses depois, voltei a pegar numa mochila rumo ao 764 que para mesmo à porta da Católica. Naturalmente desconfiado, devo dizer que entrei com receio de não existir uma única pessoa com a qual me identificasse naquela faculdade. Conhecia uma ou duas pessoas, nada de especial. E sabem que mais? A primeira semana foi francamente má. Estava mais sozinho que acompanhado, e escrevia pequenas rábulas que enviava aos meus amigos relatando episódios que hoje julgo ter hiperbolizado. Na semana de praxes, conheci todo um mundo novo que ainda hoje me deixa completamente assolado de tão bom que foi. Desde a carismática presidente, os trajados que tudo fizeram por mim e pela minha rápida integração, até aos colegas que cá conheci e hoje quero acreditar que não se irão embora… Apenas aceitei que o meu destino seria ser um infame ‘gatólico’. Aceitei que o meu destino seria ser feliz, ali. A Católica foi, a partir da segunda semana de aulas, a minha casa.

Reparem, leitores, que a Católica não é o que fazem dela. Muito riam os meus amigos locais. Riam da Católica e dos seus ‘betos’. Quero frisar que não sou rico, não tenho um Mac nem um iPhone, tenho um humilde carro que adquiri com o meu próprio dinheiro, pago a minha gasolina e, note-se, que só o uso em ocasiões de festa. Sou um fiel cliente da Carris e critico tão pouco quanto me é possível. Levo comida de casa e aqueço num micro-ondas. Visto roupa que tenho há muitos anos e comprar uma peça nova é bastante raro. Mais recorrente é comprar uns ténis, algo que acontece apenas de 3 em 3 anos. Se existe cá malta estereotipa? Sim! Claro que sim! Mas não há em todo o lado? Cá em casa todos os meses fazemos uma vaquinha para pagar a mensalidade desta que é uma Universidade de respeito, independentemente de tudo o que o senso comum vos possa fazer achar. De que também admito que fui vítima, antes de ter encontrado aqui a vontade de me levantar às 7:15 de manhã, como nunca tinha tido antes.

Hoje, eu estudo. Eu bebo a minha cerveja. Eu saio à noite. Eu tenho inúmeras pessoas com as quais me identifico. Eu vou à praxe (e respeito-a muito). Eu rio-me, com vontade. Sou só um rapaz de quase 20 anos que encontrou o que tanto queria, passado muito tempo. Hoje, sou feliz.

 

No final do dia, sou caloiro. Pela segunda vez. Mas um caloiro que seguiu o seu sonho e desde a Católica que nunca mais olhou para trás. E se há conclusões que posso tirar disto é que a vida é o que nós queremos que ela seja. É o que nós queremos fazer dela. E se achares que não estás feliz, muda. Luta. Permite-te errar. Deixa morrer todos os (pré)conceitos que possas ter em relação ao que quer que seja. É uma vida nova. És, ou vais ser, universitário. O mundo é infinito e podes ser quem tu quiseres. Se o céu o limite? Não, se quiseres ir mais longe, vai. Porque tal como o melhor e o pior, o limite é um conceito estupidamente subjetivo. E também ele um juízo que, para mim, não existe.

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Este texto faz parte de uma série de textos de opinião de alunos do ensino secundário e superior sobre a sua visão do ensino e da educação.

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