O número de estudantes do ensino superior que acumulam os estudos com trabalho continua a crescer e atingiu, no ano letivo de 2023/2024, o valor mais alto da última década. Segundo dados fornecidos pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior ao Jornal de Notícias, mais de 41 mil alunos obtiveram o estatuto de trabalhador-estudante, representando 9,2% do total de inscritos – a percentagem mais elevada dos últimos dez anos.
Em comparação com o ano letivo anterior, este número representa um aumento superior a 6%. Com exceção da quebra registada no primeiro ano da pandemia, esta é uma tendência de crescimento contínuo desde 2017/2018, sobretudo entre os estudantes de licenciatura.
Para as federações académicas, este aumento está diretamente relacionado com os custos associados à frequência do ensino superior. Pedro Neto Monteiro, presidente da Federação Académica de Lisboa (FAL), destaca que muitos dos estudantes que trabalham são deslocados – um grupo que representa cerca de 30% do total. “Os custos do ensino superior não têm vindo a descer, o que obriga muitos alunos a trabalhar para suportar despesas que as famílias não conseguem cobrir”, sublinha, apontando os elevados preços do alojamento como um dos principais fatores de pressão financeira.

As federações têm vindo a defender a criação de uma regulamentação nacional que assegure direitos iguais a todos os estudantes-trabalhadores, independentemente da instituição que frequentam. Francisco Porto Fernandes, presidente da Federação Académica do Porto (FAP), alerta que Portugal acompanha a média da OCDE no número de estudantes que trabalham, “mas não pelos melhores motivos, e sim devido a carência socioeconómica”. Esta realidade, afirma, compromete muitas vezes o sucesso académico.
A FAP propôs a criação de um estatuto nacional do estudante do ensino superior, com especial atenção à situação dos que conciliam o estudo com o trabalho. A FAL reforça ainda a importância de maior fiscalização e regulação por parte do Estado. Atualmente, a proteção oferecida a estes estudantes varia consoante a instituição: “Há universidades com épocas especiais de exames para estudantes-trabalhadores e outras que não as têm”, refere o presidente da FAP, destacando a urgência de uma regulamentação uniforme a nível nacional.
Tanto a FAP como a FAL aguardam agora os resultados de um estudo encomendado pelo Ministério à Universidade Nova de Lisboa, que deverá servir de base a uma futura reforma na ação social no ensino superior. Entre as medidas previstas no programa do Governo está o ajuste do valor das bolsas aos custos reais de frequência e o reforço da progressividade nos apoios sociais.
O estatuto de trabalhador-estudante pode ser atribuído a quem frequenta qualquer nível de ensino com duração igual ou superior a seis meses, sendo a sua manutenção dependente do aproveitamento escolar no ano anterior. Paralelamente, o Código do Trabalho determina que o horário laboral deve ser adaptado, sempre que possível, para permitir a frequência das aulas. Quando isso não é viável, o estudante tem direito a dispensa para assistir às aulas, sem perda de vencimento ou outros direitos laborais.
A crescente realidade dos estudantes-trabalhadores evidencia a necessidade de respostas mais eficazes por parte das instituições e do Estado, de forma a garantir que o acesso ao ensino superior não seja comprometido por fatores económicos e que todos os alunos possam concluir os seus estudos com sucesso.