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Recálculo das classificações internas de anos anteriores: não nos prejudicará a todos esta ilusão?


As mais recentes medidas propostas pelo governo no dia 17 de abril de 2020 para a determinação da nota de candidatura pelo regime geral de acesso garantem, segundo o Ministério, a igualdade de tratamento entre os estudantes candidatos, através de um método que aparentemente não prejudica nenhum candidato, inclusive alunos que terminaram o ensino secundário em anos anteriores. Será que estas alterações contribuíram realmente para assegurar a equidade nas condições de acesso? Ou serão elas uma falácia que acentua disparidades entre os diferentes candidatos?

Sabemos que, atualmente, os exames nacionais são a principal fonte de homogeneidade entre estudantes portugueses, que frequentando diferentes instituições de ensino, com níveis de exigência bastante distintos, acabam por ser submetidos a um momento de avaliação comum. A ponderação de 30% dos exames nacionais na classificação final de disciplina apresenta, portanto, um papel elementar na igualdade de acesso ao ensino superior, contrariando a inflação de notas por parte de várias escolas portuguesas.

A nova fórmula de acesso ao ensino superior prevê que alunos que tenham descido as suas classificações internas da disciplina devido aos exames nacionais, vejam essas médias recuperadas. Este recálculo das classificações finais, embora por muitos considerado o método mais justo de um ponto de vista macroscópico, levanta diversas e importantes questões que parecem estar a ser desvalorizadas. Primeiramente, alunos que mantiveram ou subiram as suas classificações finais nos exames serão prejudicados relativamente a aqueles que, descendo as suas classificações com a realização de exames nacionais, assistem a uma subida significativa das suas médias internas, vendo-se em vantagem no acesso ao ensino superior. Por outro lado, mesmo os concorrentes que aparentemente beneficiam destas novas medidas e que, por isso, defendem a aplicação das mesmas, parecem esquecer que a subida das suas médias internas não é um fenómeno isolado e deve ser comparado com o panorama geral dos candidatos. Ora, vejamos: a maioria dos estudantes portugueses assiste a uma descida das suas classificações finais com a realização dos exames e, se alguns descem em poucos, outros, por apresentarem as suas notas bastante inflacionadas, chegam mesmo a descer em todos. Portanto, o benefício ilusório que esses alunos parecem ganhar deixa de ser relevante quando comparado com a subida que alunos com classificações internas muito inflacionadas passam a verificar.

Havendo vagas limitadas para cada curso, e sendo os alunos seriados de acordo com as suas classificações, não iremos ter uma maioria, como até agora se pensava, beneficiada com estas medidas, mas sim uma subida substancial e, para muitos, inesperada, das médias de acesso ao ensino superior. Esta subida significativa das médias de acesso poderá ter ainda um maior impacte em cursos com médias tipicamente elevadas como Medicina, engenharias, Economia, Gestão e Comunicação Social.

 

Naturalmente que este ano é atípico e exige medidas extraordinárias, contudo as soluções que se apresentam para a educação portuguesa não podem acentuar desequilíbrios entre as condições de acesso dos candidatos e comprometer, a poucos meses do acesso ao ensino superior, o percurso de muitos estudantes portugueses.

Noto que existe uma felicidade generalizada de alunos que se julgam beneficiados com as novas medidas propostas, mas acho importante salientar o caráter ilusório das mesmas. Apesar da maioria dos candidatos assistir a uma subida das suas médias de acesso, é bastante provável que essas médias não subam tanto quanto as médias mínimas de acesso ao ensino superior, o que prejudica a maioria dos alunos portugueses. Este problema não atinge apenas aqueles que mantiveram ou subiram as suas médias nos exames nacionais, é, na verdade, um problema geral, que integra a maioria e põe em causa a igualdade de acesso.

Não nos prejudicará a todos esta ilusão?

 

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Este texto faz parte de uma série de textos de opinião de alunos do ensino secundário e superior sobre a sua visão do ensino e da educação.

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